Visão geral e alguns conceitos de Álvaro Vieira Pinto[i]
Freitas ressalta que o que permeia os
escritos de Vieira Pinto é a enunciação do conceito de trabalho no Brasil. Visto
como ideólogo do desenvolvimento e trazendo o léxico cepalino, Vieira se
pergunta sobre o que é trabalhar na periferia sob a dominação econômica e
cultural do centro.
Nesse sentido, ele valoriza o uso da
técnica e tecnologia para substituir o trabalho manual, porém mostra a situação
assimétrica na divisão internacional do trabalho que teria deteriorado os
termos da troca propostos por David Ricardo. A qualidade de vida está no centro,
na periferia estão os exportadores que, donos de uma consciência ingênua,
exportam o ser e importam o não ser.
A valorização da técnica aparece no
trabalho de Vieira, como bem nos mostra Freitas, no conceito de amanualidade,
isto é, quanto mais elaborada a capacidade de trabalhar, mais humanizado o
trabalhador. Em Vieira, há uma antropologia que se desloca para a antropomorfia
aproximando a forma-homem da forma-trabalho.
Na medida que aumenta a técnica, o
trabalhador toma sua consciência e percebe que pode mudar a realidade que tende
à imutabilidade nas mãos da consciência ingênua. Quanto mais elaborada a
técnica, mais claramente a consciência se expressa. Para Vieira, não há
incultura, mas graus de cultura[ii]. Então, se a ferramenta é
precária, há o subdesenvolvimento intelectual. A visão de mundo nos é dada pelo
trabalho e suas ferramentas.
Vieira Pinto tematizou o trabalho do ponto
de vista de quem trabalha, mas para ele a luta de classes era uma contradição
secundária. Pela sua ótica internacionalista, a relação entre desenvolvimento e
subdesenvolvimento era aviltante e constituía a contradição primária. Vieira via
a fase histórica no Brasil como simultânea e não coetânea, sob uma ótica da
antropologia existencial do terceiro mundo: nela há vários estamentos sociais
históricos coexistindo.
Conforme dito, então, a luta interna pelo
desenvolvimento é representada por um pêndulo que oscila entre a consciência crítica
[do trabalhador] que acelera e a consciência ingênua [do exportador] que
atrasa. Esse ponto de vista fundado no ferramental, conforme entendemos de Freitas,
tem um estatuto epistemológico na aquisição de consciência, tratando-se de um
empirio-historicismo.
Freitas conceitua Vieira Pinto como um
existencialista que também se utiliza de ferramentas analíticas marxianas. Ocorre
que ele transforma a noção de consciência marxiana universal em uma
existencialista individual[iii]. Na sua morfologia
sujeito-trabalho, o homem está em situação, ou seja, ele percebe os limites do
sistema social. E é o progresso nas formas de produção que eleva a consciência pelo
aumento no nível de instrução e cultura, trazendo nova compreensão da
realidade.
Sobre a visão tecnológica, para Vieira Pinto
não há uma era tecnológica pois o homem sempre foi tecnológico. E a tecnologia
deve servir ao rico e ao pobre. Entretanto, não é só o acesso, mas uma
produção social que visa a amanualidade. Ela é acumulação social de conhecimento,
conforme citação: “O avião não foi feito para voar, mas para o homem voar”.
Se o trabalho aliena? Segundo Vieira, não,
se há apropriação de técnica elaborada pelo trabalhador. Ante o existencialismo
heideggeriano, para quem a técnica é um malefício, Vieira traz a proposta do
existencialismo da periferia com relação ao centro.
[i] VIEIRA PINTO, Álvaro. O
Conceito de Tecnologia. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005. Notas sobre a
introdução de Marcos Cezar de Freitas.
[ii] Assim era como Paulo Freire via o
analfabetismo, ele que tinha Vieira Pinto como mestre. O método coloca a
realidade no início, há um processo de absorção das imagens da realidade das
pessoas, uma imagem concreta do meio.
[iii] Freitas também aborda sua oposição
ao aspecto pragmatista e isso, em certo sentido, agrava meu sono dogmático visto
que eu estava estudando a filosofia analítica. Trabalhar com TI e ler pragmatismo?
Céus!
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