Traz um panorama das preocupações de Gottlob Frege[i]
Filho argumenta que Frege não deve ser
considerado um filósofo da linguagem porque a questão do significado não é central
na sua filosofia. De acordo com o autor, Frege tem um projeto de fundamentar a aritmética
na lógica, projeto que é um dos precursores da lógica moderna e conhecido como
logicismo[ii]. Além disso, essa
proposta viria na esteira kantiana de tratar a matemática como um conhecimento
a priori, mas compostos de intuições puras e, nesse sentido, com proposições sintéticas
a priori. Entretanto, para Frege, a geometria, sim, dependeria de intuições
puras, haja vista a sua dependência espacial, já a aritmética, caso rompendo com
essa premissa, seria feita de proposições analíticas.
Isso posto, não se pode negar a
contribuição de Frege para a filosofia da linguagem, embora seu conhecido
artigo Sobre o sentido e a referência busque mais resolver problemas de sua
lógica formal do que estabelecer uma teoria semântica. Em SSR, sempre de acordo
com Filho, Frege investiga se a identidade é uma relação entre objetos ou entre
os nomes dos objetos, para concluir que há problemas em ambos os casos, tornando-se
necessário lançar mão do sentido. Pois bem, nas sentenças:
(1) A Estrela da Manhã é a Estrela da Manhã
(2) A Estrela da Manhã é a Estrela da Tarde
Temos que, (1) é mera tautologia, mas (2)
traz uma informação nova, nada menos que uma descoberta astronômica e, aí, tais
sentenças têm conteúdo cognitivo diferente. Bem, se a identidade fosse apenas
de objetos, qual seja, do tipo a = a, estaríamos falando sempre de Vênus, mas
isso não explicaria a diferença de conteúdo cognitivo entre ambas. Então, a
identidade de objetos não da conta dessas sentenças de identidade que se
referem ao mesmo objeto, mas que tem conteúdo cognitivo diverso.
Por outro lado, a identidade também não
poderia ser uma identidade entre os nomes de objetos, pois essas atribuições podem
ser arbitrárias e não trazem conteúdo cognitivo relevante como em 4 = IV ou 4 =
<símbolo de espadas>. Já em 4 = <raiz quadrada de 16> há um
conteúdo cognitivo relevante, muito além da trivialidade de a = a ou da arbitrariedade
que acabamos de mencionar. Então, nem o símbolo (o nome do objeto), nem a
referência (o objeto) são suficientes para a identidade, donde surge o sentido
como modos diferentes de apresentar um mesmo objeto. Conforme Filho: “Agora, de
SSR em diante, é a noção referência que cumpre o papel de valor semântico das
expressões da linguagem formal de Frege” (p. 13). Como ele acaba de realizar
através do uso dos nomes próprios para fazer a distinção entre sentido e
referência.
Porém, o que traz complicações ao tomar
Frege para a realização de análises de linguagem é que, na continuação de SSR e
conforme explica Filho, Frege usará o valor de verdade[iii] como para o papel de
referência para sentenças, ou seja, seu valor, mas isso atende a um ponto de vista
da linguagem formal. Ora, isso faz com que:
(3) Aristóteles é grego e
(4) 2 + 2 = 4
Tenham a mesma referência, soando
estranho do ponto de vista de uma teoria do significado. Mais ainda, como valores
de verdade são objetos, há uma equiparação entre sentenças e nomes próprios que
torna essa teoria indesejável do ponto de vista da linguagem.
[i] Resgata trechos da aula inaugural
do curso de Filosofia da UFSJ, ministrada no dia 21 de agosto de 2008 pelo professor
Abílio Rodrigues Filho. Acesso em 09/04/2022 pelo endereço eletrônico: https://ufsj.edu.br/portal-repositorio/File/Ab%EDlio%20Rodrigues.pdf.
[ii] Nosso intuito inicial era começar um
estudo mais aprofundado da filosofia da linguagem por Gottlob Frege, que parece
ser o pai da lógica moderna, até nos depararmos com esse texto que estamos
tratando.
[iii] Na Conceitografia (CG) Frege tentou
usar conteúdos conceituais como valores semânticos de sentenças, mas sem
sucesso. A noção de conteúdo conceitual versa que duas sentenças têm o mesmo
conteúdo conceitual quando são intersubstituíveis, porém essa tese apresentou inúmeros
problemas que viriam a ser resolvidos na SSR. Vale ressaltar que a CG cria uma linguagem
formal como um sistema completo de lógica proposicional e de predicados jamais
visto desde Aristóteles.