domingo, 28 de setembro de 2014

Um pouco de ficção

Conforme argumentação de Vaihinger, há ficção na base do conhecimento. Mas, se as grandes teorias científicas se assentam sobre ficções (por exemplo, a teoria de atração gravitacional, que é uma abstração e hipoteticamente proposta por Kepler e depois Newton; o feixe de luz como se fosse uma onda, etc.), qual a garantia epistemológica da ciência?

Se, conforme Popper, a ciência é provisória, qual o valor dos juízos analíticos kantianos? Se há uma lógica na qual eles se baseiam, essa lógica de nada adianta se não for aplicada. Mas a aplicação dos juízos analíticos desemboca praticamente nas ciências. E mais, por que não se pode fazer metafísica, por que a razão somente pode tratar dos fenômenos? Se chegarmos a tal ponto de ceticismo, a uma dissociação tão radical da realidade com a racionalidade, perdemos qualquer ponto de apoio.
Se a metafísica versa sobre o imponderável, o que dizer do artifício das ficções? A ficção é um construto da razão e, como tal, é subjetivo. Tempo e espaço, que são as condições da estética kantiana e são dados a priori, também não fazem parte desse construto engenhoso? Até onde isso vai?

É ilimitado o mundo criado pela mente humana. O Homem concebeu um mundo e nele vive. Esse mundo concebido não é o mesmo mundo que está aí, embora eles paralelamente se desloquem e coincidam (essa ideia remete a Leibniz e as mônadas que vivem simultaneamente isoladas, tudo com elas e entre elas acontecendo ao mesmo tempo, causa e efeito em cada uma delas, separadamente). Uma vez criado esse mundo, ele se perpetuou de tal forma que, hoje, nesse momento, agora (!!!), ficamos a mercê do produto aparente que se torna quase impossível comprovar qualquer tipo de conhecimento ou julgamento, ou qualquer coisa que remeta a algum tipo de verdade.

Mas, se é assim, vivemos sobre o caos. Ele está abaixo de nossos pés, a frente de nossas mãos e atrás de nossas costas. Se é assim: por que tanta seriedade??? Por que levar tão a sério algum tipo de trabalho que se baseia na epistemologia??? Isso abre caminho para o humanismo, porque não precisamos de ciência para nos relacionarmos com o outro...

Tal ceticismo ficcional traz consigo o nominalismo que se aparta do mundo: a cabra é mais "palavra cabra" do que "bicho cabra" - ainda mais hoje quando não mais vemos bichos...
As qualidades das coisas: só as conhecemos pelos nomes e pelas sensações que delas temos, não as conhecemos em si. O nome evoca a coisa e provoca seu efeito, às vezes, antes mesmo da coisa (isso já nos mostrou Sartre sobre a intencionalidade da consciência, o imaginar que provoca algo, o ausente que se faz sentir, o pensar no frango e sentir fome, o lembrar da carne podre e sentir enjoo da carne boa).

Quando o homem concebe o mundo (no sentido de gerar, parir - dito antes), é esse mundo idealizado que é intersubjetivamente compartilhado entre cada um, esse mundo idealizado serve de base para as convenções que são utilizadas na sociedade, de uma maneira geral. Há sempre um algo traduzindo o mundo: há um mundo lá - esse mundo real é descrito por palavras, pela convenção linguística. Há um mundo lá que pode ser previsto pelas ficções, pelas abstrações criadas pelo homem. Linguagem e ficção são criadas pelo homem e para o homem. Pensando nas 3 desilusões alertadas por Freud: 1. não somos o centro do Universo (heliocentrismo); 2. não somos originados por Deus (darwnismo); e 3. a sua: existe uma subconsciência alheia ao mundo e ao homem e que pode ser responsável por nossos atos; qual o recado da ficção, das linguagens? De fato, não nos relacionamos nem com uma realidade de mundo e nem e de forma direta entre nós. Há sempre uma criação e uma virtualidade contida nas palavras, nos movimentos e intenções: somos passivos, somos reflexos de nossas próprias criações - cada vez menos originais.

A própria linguagem inventada pelo homem evolui, as palavras mudam de significados, as palavras se fundem e se consolidam, novas se criam. Essa mudança de sentido das palavras tem como pano de fundo uma possível falsidade da linguagem? A língua não é certa, ela se constrói. E, por isso, as palavras mudam? Palavras não são números. Os números são - há sempre uma atualidade neles. As palavras, eram, estão e serão. Virão a ser o que um dia deixaram de ser, ou poderão ser o que um dia não foram?? Ao representarem coisas que deixaram ou deixarão de existir, mesmo assim ainda subsistem? Que ficção pode ser construída com que tipo de palavra? Precisamos investigar essa relação entre a palavra que representa uma realidade diretamente e uma palavra que é usada em uma ficção. Porque a associação linguagem-ficção multiplicada pelo homem tem responsabilidade mesmo que seja naquele humanismo que ressaltamos anteriormente.

Aula da Filosofia da Arte de 22/09/2014

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Patologia

A patologia é artificiosa, usa de artimanhas indecifráveis. Ela derrama o véu de maya sobre o mundo e ele se torna sôfrego e IMPLACÁVEL. Como acordar? É preciso se submeter?

Mas, ao se submeter, não se acorda. Que dilema!!! Há um mundo REAL. É preciso enfrentá-lo. Mas, a doença não deixa. Mas, a doença não é real. É patológica. Não há meios: precisamos lançar mão da evolução e, por conseguinte, da medicina.

Mas, a medicina não é o remédio único, ela é o remédio geral e não se aplica a TODOS os casos. Nem sempre, ininterruptamente. É preciso saber a dose certa: é preciso parar!!!

Há um desconhecido, fruto da imaginação. Mas, ele só vale no sonho. O mundo é REAL. Deixemos a patologia para o sonho. É bom, porque acorda-se. Mas, também é preciso dormir tranquilo...

Mas, a patologia vem de algo marcado. Algo que CHEGOU até nós. Ou mesmo algo que produzimos. Mas, a patologia é algo real agora, mesmo que tenha sido CRIADA no passado. Importa descobrir? Qual o sentido da vida?

Mistério!!!

Faremos força para descobrir ou vamos vivendo? A vida é sempre um fardo porque é imprevisível. Queremos descobrir? A vida é um gozo, um jogo. Descobre-se uma coisa, mas não se descobre tudo. Então... Tanto faz!!!

Mas,tem sempre uma patologia no mundo (no mundo da cabeça do homem, porque o mundo é uma coisa que está aí). Cura-se uma e ganha-se outra. Certamente é preciso viver melhor. Superar medos e domar a ansiedade. Mas, calma!!! Existe um ponto de limite. Dele não se passa. O limite existe acima e abaixo. Estabilidade, esse é o segredo.

Algo assusta. Buscamos associações. Não sejamos detetives, sejamos vivos. Viventes.

Porque a patologia não se cura falando. Ao falar se representa, a essência é perdida. Há influências. Nos curamos vivendo. A segurança está dentro de nós. O falar quebra tudo porque tem intenção. E não se pode equiparar um pensamento a um fato. Fatos acontecem. Pensamentos perturbam.

O roteiro não é meu. Vomitado durante Freud, além da alma.

domingo, 21 de setembro de 2014

Há muito por fazer

Não podia passar sem uma reflexão o contato com a arte de Bergman. Através de um espelho desnuda o interior e o conflito da experiência familiar e nos envolve em um quadro psíquico intenso. Se Karin sofre de transtorno que a projeta em uma outra realidade, a proximidade da família revela o desejo de felicidade. Sua delicadeza liga três homens: pai, irmão e esposo. A patologia que sobre ela incide covardemente, embaralha suas metas.

Mas Karin quer fazer. Ela luta. Nós lutamos. O que nos move? O que é possível fazer? O mar, o escuro, o vento e o barulho das ondas. Uma ilha, férias. Gritos de pássaros ao longe e perto. Melancolia. Karin quer fazer. Mas o que ela pode fazer? A doença destrói o que nos diferencia: a consciência, razão, sobriedade. A doença que chega sorrateira rouba-lhe a autonomia.

No momento de crise: controle. Tranquilizantes. Invasão. Ela sente e eu sinto. Ela não chora, eu choro. Ela não sabe ou sabe demais naquele momento? Eu sei que ali algo se vai, a maneira com que lidamos com a doença é bruta. Pedro soube, meu pai sabe. A crise vem, VEM, crescendo... ABOCANHA!!!

Mas Karin quer fazer. Ela quer fazer algo PARA o outro. Mas como?? O que fazer?