quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Sobre mesa[i]

Nesse primeiro capítulo Russell aborda um objeto simples, uma mesa, para enfatizar o problema do conhecimento, por um lado e, por outro, o papel da Filosofia. Desde este início já podemos notar o uso do método cartesiano e a refutação ao idealismo.
Ao se perguntar se há algum conhecimento no mundo do qual não se pode duvidar, Russell entra no campo da teoria do conhecimento argumentando que só uma filosofia crítica e não dogmática pode responder, depois de muita investigação. Retomando Descartes, mas sem [ainda] o citar, Russell analisa a mesa para mostrar que o conhecimento oriundo da experiência é duvidoso e controverso já que nossos sentidos não são sempre precisos e que há diferentes pontos de vista que variam em cada um de nós, com relação à mesa.
O questionamento do conhecimento pelos sentidos levanta a questão central da aparência versus realidade. Tomamos por real uma mesa a partir de suas características aparentes, ou seja, do que inferimos do que vemos. E existe muito de nós no que vemos: a forma da mesa criada por nós não vem somente da mesa, mas do que nossa sensação obtém. A isso Russell nomeia “dados-dos-sentidos”, contrapondo-os ao objeto físico.
A mesa que vemos e temos, então, são dados-dos-sentidos, mas há de fato uma mesa real? Há um objeto físico despido de dados-dos-sentidos e livre de nossa sensação? Essas questões podem ser extrapoladas para uma questão mais ampla: há, de todo, matéria? Tal questão do problema do conhecimento foi respondida, como Russell retoma, pelos idealistas. Para eles só há mesa para uma mente, ou seja, há uma mesa lá porque estamos cientes dela. Porém, ao fecharmos os olhos, a mesa desaparece? Com certeza não, porque Deus está ciente, de acordo com o bispo Berkeley.
Desse modo adentramos no terreno da dicotomia mente e matéria. Há uma mesa dura, marrom, que eu posso tocá-la e o faço pela garantia da mente de Deus. A filosofia de Berkeley supõe que a mesa real é feita de mente e põe em dúvida a existência da matéria. E, não podemos considerar essa ideia absurda, pois foi acompanhada por muitos filósofos.
Russell considera tal argumento falacioso e retoma a dúvida: há objeto físico, matéria? De que natureza? Para Russell há razões para supor que há uma mesa real e a investigação continuará, mas, por agora, já mostrou o papel da filosofia: tornar uma simples mesa um problema cheio de possibilidades.



[i] Há uma primeira resenha desse primeiro capítulo de Russell disponível no link que se segue: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2019/04/o-mundo-nao-existei.html. Já a atual é feita com base na tradução de Desidério Murcho, Edições 70. Abril de 2008. RUSSELL, B. “Os Problemas da Filosofia”.