terça-feira, 28 de junho de 2022

Segunda problema

A segunda-feira sempre foi um problema para mim. Houve uma época em que eu sentia um grande vazio existencial segunda à noite e só me restava a alternativa de ir para os botecos tomar uma cerveja e “rebater o fim de semana”. Essa solução se mostrou um tanto cara e maléfica para a saúde, mas isso foi “lá traz”, lá pelos idos de 2005, 6.

O tempo passa e, na minha estada no Rio de Janeiro (7-10), a “síndrome da segunda-feira”, às vezes, durava até quarta ou quinta-feira. Não se sabe porquê, mas a terra de São Sebastião não me ajudou quando o assunto era trabalho. Enfim, o tempo passa e a gente toca o barco. Na volta para a SP, a terapia me ajudou a afastar esse problema com um pouco de conversa e alguns remedinhos. Nada de mais, digamos que uma dose de uma cachacinha feita em laboratório.

Tudo vai e tudo vem, pandemia e a coisa toda, e eis que estamos aqui, terça-feira, 6h AM, nos defrontando com esse texto resultado do que chamo de uma insônia de última milha e que tem me acometido no que, já vai tarde se ainda não foi, 2022. A experiência e a barba branca, contudo, me ensinam a “modular”, digamos, a questão. Dá para conviver: entre despertares por volta de 4 ou 5h da manhã, um pouco de sofá e tuite me trazem de volta para a cama e o sono. Mas, cá entre nós, embora não afete meu dia, poderia ser melhor né?

Bem, o Rufino[i] aponta o caminho: trabalhar três dias na semana e folgar quatro. A Lívia trabalha quatro e folga três, mas o inimigo ainda está ganhando. O Safatle tem dito que na Europa eles têm tentado reduzir a carga de trabalho, mas esses sacanas desses branquelos tomaram o Brasil de assalto e acabaram com a nossa relação com a natureza, que agora ocorre mediante o trabalho.

Reverter isso levará tempo, mas é, sem dúvida, a melhor alternativa. Produzir demais não ajuda ninguém, mas quem sou eu para dizer, que estou quase um workaholic. Ora, voltarmos para as formas de vida de nossos povos originários e, com a sabedoria deles aprendermos, é o melhor que temos a fazer, afinal, ainda está em nosso DNA, mesmo que tentemos brutalmente acabar com essa marca indelével.



[i] Em Arruaças, Mentira vira verdade e verdade vira mentira, a respeito do Neco.

sexta-feira, 24 de junho de 2022

unidade semântica

Faz uma exploração inicial acerca da possibilidade de se encontrar uma unidade semântica

Em termos gerais, a sintaxe é aquela que trata das regras gramáticas ao passo que a semântica se preocupa com o significado, que é coisa difícil de definir e entender. Isso porque um significado em si é uma passagem para alguma coisa, isto é, é um signo. Então, um significado significa algo: uma ideia em nossa mente, uma memória, um fato no mundo ou até uma ludibriação. Vejamos:

1. A frase “Que vontade de comer uma picanha” pode indicar a sensação de comer uma picanha nesse momento, por fome, desejo, whatever.

2. Já “Que vontade de comer aquela picanha” pode se referir a um fato, ou melhor, há uma carne comida outrora.

3. Por outro lado, “Que vontade de comer picanha” referir-se-ia a um argumento tolo em uma discussão sobre a proteína do almoço de amanhã.

Pois bem, voltemos ao título e perguntemos: Qual a "unidade semântica” do que foi até agora explicitado? Seria a picanha, a vontade, comer ou nenhuma das anteriores? Por nenhuma das anteriores abrimos o leque de tudo-o-que-existe, que são as mais variadas teorias psíquicas sobre o desejo de comer picanha, teorias fisiológicas sobre o efeito da picanha no corpo, teorias ecológicas sobre a pastagem do gado origem da picanha, elocubrações veganas relativas à piedade de se matar os pobres bichanos, e por aí vai.

Em resumo, podemos encontrar uma unidade semântica ou a própria unidade semântica é semântica, qual seja, dependente da própria maneira de como entendemos a semântica, ou de um ponto de vista objetivo, daquilo que é aceito por muitos (“a picanha está muito cara atualmente”) ou do que se entende subjetivamente (“picanha era carne de segunda, antigamente”).

Um ponto evidente a se ressaltar é que se trocarmos “picanha” por “feijão”, “comer” por “cozinhar” e “vontade” por “raiva”, todos os exemplos significantes que levamos em conta até agora cairiam por terra, exceto a estrutura da argumentação. Clarificando, a busca pela unidade semântica emerge agora como uma negação do significado em si. Repetimos: buscar a unidade semântica significa abrir mão do significado aplicado e entender, usando a linguística ou a filosofia, se a unidade semântica pode ser uma classe gramatical (substantivo, verbo...), uma frase (sentença, proposição...), um parágrafo ou o texto todo (poderíamos, talvez, usar máquinas, algoritmos de computação e matemática para tentar nos ajudar nessa identificação).

De novo, peguemos esse texto (a tal da autorreferência) e façamos o teste: extraio significado do título, de algumas palavras chave, de cada uma das frases individualmente, dos parágrafos ou do conjunto da obra? Se isso é importante? Claro! Nossa maior aquisição é a linguagem, embora muito mal utilizada.

quinta-feira, 2 de junho de 2022

Referência Indireta e Humanidade

Me parece sobremaneira interessante fazer um recorte da chamada teoria da referência indireta, como a nós pareceu. Vejamos: há um nome, talvez uma expressão ou proposição, ou seja, um recurso linguístico que tem um sentido antes de ter uma referência. Mais do que isso, o sentido é mister, é mais do que a referência e pode até dela prescindir.

Por exemplo, tomemos a frase: “Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá”. A semântica fregeana se perguntaria pelo sentido dela e não pela referência, isto é, se há palmeiras e se nela existem sabiás que cantam. Se eu digo: “Superman!!”, o que quero dizer? Ao analisar esse nome, “Superman”, eu penso no Superman em si ou no homem que vai me salvar? Ou no homem que usa uma capa vermelha? Engano, não é um homem, pois veio de outra planeta...

Parece óbvio, não é? Há tantos sentidos e há uma referência, mas quantas e repetidas vezes vivemos do sentido? Esquecemos completamente a referência e tratamos do sentido que a ela queremos dar. Diz a mãe: “Ah, meu menino...”, ao que o outro responde: “Que menino o que boba, já passou dos 30!”. Vê? São sentidos bem diferentes. Quem tem razão? Basta olhar para a referência? Certamente não. Então? Há o impasse e, daí, o diálogo.

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As notícias recentes me fizeram pensar sobre a expressão: “crime contra a humanidade”. Ela se refere a agentes da Polícia Rodoviária Federal que assassinaram Genivaldo em Sergipe, em Umbaúba, semana passada. Os policiais assassinos executaram esse cidadão pela tortura: espancamento e câmara de gás. Tortura é um crime contra a humanidade. Mas o atual presidente é um genocida, e também cometeu crime contra a humanidade durante toda a pandemia, reiteradamente.

Humanidade... Humanidade que é o que eu tenho, você tem. Humanidade que é muita gente ou toda a gente do planeta. O crime de tortura que as polícias brasileiras praticam, e agora com maior complacência, é um crime contra a humanidade de uma pessoa. Quando você tortura uma pessoa, ela deixa de ser humana. O genocídio que o atual presidente cometeu na pandemia, e que ainda quer cometer, visa pobres, minorias, indígenas, etc., é um crime que coloca em risco a humanidade como um todo, se a moda pega.

Nesse "sentido", não importa a referência, o que importa é o sentido mesmo: fascismo.

PS.: inspiração oriunda dos vídeos de Ruffino sobre Frege e tristemente ancorada na tragédia brasileira.