Aspectos
de Lógica Elementar[i]
Resumo. Esse texto condensa
aspectos fundamentais de lógica a partir de um resumo de um manual de lógica, o
manual de Desidério e o resumo de Polónio. A lógica analisa os raciocínios,
coisa típica do ser humano, coisa que usamos no dia a dia. Mas não se fala só de
lógica porque aqui estamos em um espaço de reflexões filosóficas[ii].
Capítulo 1: Lógica.
Polónio inicia sua análise da obra de Desidério abordando o raciocínio como
“tentativa” de provar uma conclusão baseando-se em premissas. Grande parte do nosso
conhecimento é obtido raciocinando-se em busca da verdade sem querer convencer
alguém. Por outro lado, quando ser raciocina por meio de argumentos, primeiro visamos
persuadir alguém a aceitar uma conclusão já estabelecida[iii]. Um raciocínio é
composto por frases articuladas, entidades físicas que, quando usadas para
asserir, são declarativas e têm valor de verdade; caso contrário são absurdas,
um mero jogo de palavras. Na filosofia, o conteúdo de uma frase declarativa é
chamado, embora não consensualmente, de proposição.
Um ponto de atenção, é que os raciocínios
estão embutidos em discursos – há que procurá-los, verificando-se o que desempenha
papel inferencial, os chamados indicadores de inferência. Por exemplo: os
indicadores “logo” e “portanto” podem indicar uma conclusão enquanto que “porque”
e “dado que” normalmente indicam premissas. Ocorre que há um trabalho
interpretativo nessa busca já que esses indicadores podem não ser evidentes, e
precisamos encontrar as premissas e conclusões para que possamos representar a
expressão canônica do raciocínio, eliminando o que for dispensável ou ressaltando
o que está oculto, para decidirmos se ele é bom, ou seja, cogente[iv].
Raciocínios cogentes têm validade,
conceito fundacional da lógica, que significa que têm valor, isto é, a
conclusão não é falsa se conhecemos as condições de verdade das premissas e
sabemos que são verdadeiras[v]. Importa, mais do que
saber se uma frase isolada do raciocínio tem uma verdade atual, saber as condições
de verdade das premissas para que não se tenha conclusão falsa. Citando: “A
validade é o que permite descobrir o que antes não se sabia com base no que se
sabia”. Porém, mais do que isso, um raciocínio cogente envolve a articulação
das frases, não só a verdade de cada uma delas, isto é, só ter premissas
verdadeiras não é suficiente.
Para evitar que um raciocínio seja
circular, então, as premissas devem ser mais plausíveis do que a conclusão. Mas,
plausibilidade envolve vários fatores, já que é um juízo de probabilidade com
base no contexto e informações de fundo e traz a dificuldade de se chegar a um
consenso. Segundo ponto e fundamental: deve ser plausível para o interlocutor e
isso envolve conhecer o que é relevante para ele e tentar provar uma conclusão
que seja válida, mesmo que inicialmente não aceita por ele. Isso é persuasão e
se funda em premissas que, bem plausíveis, levam inevitavelmente à conclusão.
Capítulo 2: Verofuncionalidade.
Raciocínios têm uma estrutura de frases que lhe são comuns e que explicitam sua
forma lógica e ela deve ser suficiente para indicar se ele é válido ou não. A
lógica clássica é, assim, uma lógica formal e ela se inicia com a lógica
proposicional que Desidério prefere que seja chamada de lógica verofuncional já
que proposição é uma noção em disputa; e depois continua com a lógica
quantificada. A lógica verofuncional se limita a validar raciocínios cujas
condições de validade se dão por cinco operadores de formação de frases, ou
conectivas, que são a negação (operador unário), conjunção, disjunção,
condicional e bicondicional (equivalência).
Polónio destaca um ponto que Desidério chama a atenção: se os indicadores de inferência permitem formar frases a
partir de frases, o papel semântico das conectivas é o de formar raciocínios,
encadeamento de frases, cujo valor de verdade se determina exclusivamente pelo
valor de verdade delas, que podem ser analisados por tabelas de verdade[vi]. Então, os operadores
funcionam como funções matemáticas cujos valores de saída (no caso, valores de
verdade) são determinados pelos valores de entrada. E esses cinco operadores
verofuncionais são poderosos porque se aplicação não somente a frases binárias,
com dois componentes, mas a ternárias e assim por diante.
Para se provar a validade de raciocínios
verofuncionais por tabelas de verdade (ou validade), devemos reescrever o raciocínio
na forma canônica, conforme dito no capítulo 1, depois as frases elementares
com valor de verdade são representadas por letras minúsculas, para daí se
construir sequências de tabelas de verdade para as premissas e a conclusão e,
por fim, verificar se em alguma linha há conclusão falsa, o que quer dizer que
há pelo menos uma premissa falsa; caso contrário, o raciocínio é válido: se
todas as premissas são verdadeiras a conclusão também o é. Reverberemos junto
com os autores: o exame prova que a conclusão é verdadeira e que podemos,
então, tentar descobrir se as premissas são, de fato, verdadeiras e aí a
conclusão também será.
Por fim Polónio trata das falácias,
raciocínios que parecem cogentes, mas não o são. Ele argumenta que as tabelas
de validade são instrumentos certeiros para identificar raciocínios
verofuncionais[vii]
sem validade, não somente mero exercício extravagante de lógica. Mas, somente a
forma lógica não é capaz de provar a validade em casos em que há falta de
clareza onde é capaz que nem o próprio autor saiba o que tem em mente[viii].
Capítulo 3: Derivações.
A derivação, conforme define Polónio, é um processo de demonstração ou prova
formal por regras de inferência, como substituição ou reductio. Por exemplo,
podemos ter raciocínios com premissas inconsistentes que são chamados de
vacuamente válidos[ix],
mas que podem ser bloqueados mudando-se a definição de validade, porém, segundo
o autor, seria difícil tratar derivações vácuas com a lógica clássica.
Capítulo 4: Quantificação.
A lógica quantificada clássica estende a lógica verofuncional incluindo o
raciocínio quantificado, quando se usam predicados, nomes próprios e
quantificadores, além dos operadores verofuncionais, mas sem aumentar o poder
inferencial. É o quantificador universal “todos” e o quantificador existencial
“pelo menos um” que abreviam conjunções e disjunções. Admitindo-se um domínio
de quantificação com dois particulares, quando todos têm certa
propriedade, um e o outro a tem, quando pelo menos um a tem, um ou
outro a tem.
Capítulo 5: Identidade.
É o conceito de identidade – relação e que permite formar frases verdadeiras se
atribuída ao mesmo particular, que amplia a verofuncionalidade. As frases de
identidade têm a forma lógica a = b, como em “Vênus é a Estrela da Manhã”, que
é uma identidade numérica e se refere a apenas um particular, mesmo que seja
referido por nomes próprios diferentes. Já a identidade qualitativa refere
diferentes particulares que partilham várias propriedades como dois átomos de
hidrogênio[x].
Se um nome próprio se refere a um
particular, ele não o faz por predicados, isso é papel da descrição definida. “Francisco”
é um nome próprio que pode se referir a um particular ao passo que “o primeiro
Vice-rei da Índia” é uma descrição definida que se refere a um particular
usando um atributo (predicado)[xi].
Como a relação de identidade tem as propriedades
lógicas de reflexão, simetria e transitividade, Polónio levanta o problema do
domínio do vazio que a lógica quantificada clássica trata adequadamente. Já na
identidade, a reflexividade (x = x) deixa de ser verdadeira porque, sendo uma afirmação
existencial, isto é, do tipo “existe pelo menos um x tal que x=x”, se o domínio
é vazio, não há nenhum x para satisfazer a fórmula[xii].
Por fim, Desidério tratará, de acordo com
Polónio, da substituição de idênticos que afirma que se a = b, eles podem ser
intercambiáveis em qualquer frase mantendo-a válida. É a regra da substituição
de idênticos salva veritate, também chamada “princípio da
indiscernibilidade de idênticos”[xiii].
Capítulo 6: Árvores.
Polónio cita brevemente as árvores de verdade como ferramenta que pode provar
tanto a validade quanto a invalidade dos raciocínios, coisa que as derivações
não conseguem porque não sabemos se ainda haveria outra derivação a ser descoberta.
Elas podem ser aplicadas nas lógicas verofuncional e clássica, além de suportar
a regra da substituição de idênticos, embora trabalhe sempre por reductio[xiv].
[i] Resumo de Lógica Elementar:
Raciocínio, linguagem e realidade de Desidério Murcho, por Artur Polónio em
https://criticanarede.com/logicaelementar.html.
[ii] Capítulo 1: Lógica, Capítulo 2:
Verofuncionalidade, Capítulo 3: Derivações, Capítulo 4: Quantificação, Capítulo
5: Identidade, Capítulo 6: Árvores, Capítulo 7: Modalidade, Capítulo 8: Além da
linguagem, Apêndice: Lógica aristotélica. Aqui não trataremos dos últimos 3
capítulos: o capítulo 7 trata da lógica modal alética que é uma extensão da
lógica clássica e introduz os conceitos de necessidade e possibilidade para
analisar como as frases podem ser verdadeiras, distinguindo a verdade
contingente da verdade necessária, com o auxílio da linguagem dos mundos
possíveis. O capítulo 8 procura mostrar que o raciocínio, seja dedutivo ou
indutivo, depende de provas falíveis e exige a busca contínua por erros e novas
informações, ajustando crenças à realidade para alcançar o conhecimento. Por
fim, o apêndice diz que a lógica aristotélica, embora inovadora e influente por
séculos, possui limitações como a dificuldade em lidar com termos vazios e a
distinção entre sujeitos e termos sujeitos, o que faz com que seja considerada,
hoje, uma investigação de alcance limitado.
[iii] Em suma, enquanto todo argumento é
um tipo de raciocínio, nem todo raciocínio é um argumento. A diferença
fundamental está na intenção: descobrir a verdade versus persuadir alguém (https://g.co/gemini/share/4d29cd75b525).
[iv] Cogente: adjetivo de dois gêneros.
1. Cuja veracidade satisfaz de maneira total e coerciva o entendimento ou o
intelecto (ex.: argumento cogente). 2. Que coage ou constrange. Etimologia:
latim cogens, -entis, particípio presente de cogo, -ere, constranger, forçar,
restringir. "cogente", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa
[em linha], 2008-2025, https://dicionario.priberam.org/cogente.
[v] Raciocínios também têm todas as
premissas verdadeiras, premissas mais plausíveis do que a conclusão e paridade
epistêmica.
[vi] Conforme definição que Polónio
traz da citação de Desidério: “Um operador verofuncional pode agora ser
definido da seguinte maneira: Um operador de formação de frases é verofuncional
se e somente se o valor de verdade da frase que o tenha como operador principal
for exclusivamente determinado pelo valor de verdade da frase ou frases sem
ele”.
[vii] Há raciocínios dedutivos, do geral
ao particular e indutivos, do particular ao geral, por exemplo, conforme O
Google.
[viii] No próximo capítulo Polónio
enfatizará limitações das tabelas de validade, como quando há mais de quatro
frases elementares ou a ausência de um método para, partindo de premissas
chegar validamente à conclusão. Seu papel seria de clarificar conceitos como
validade e forma lógica.
[ix] Em conversa com o assistente de IA
da Google, parece que os raciocínios vacuamente válidos, que ocorrem na lógica
proposicional, se fiam na implicação “se P, então Q” P → Q, que só é falsa se quando
P é verdadeiro e Q é falso. Se P é falso, por exemplo quando as premissas são inconsistentes
ou contraditórias, não importa Q, isto é, a afirmação é sempre verdadeira. É uma
implicação material entre P e Q, não uma relação de causa e efeito ou algo que
tenha sentido. A matéria, nesse caso, são os valores de verdade e não tem a
ver com o significado da relação entre as proposições. É o caso de "Se a
Terra é plana, então o céu é verde".
[x] Já falamos bastante sobre esses temas
conforme os textos: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2020/02/duas-acepcoes-de-identidadei.html,
https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2020/03/criterios-de-mesmidadei.html,
https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2021/11/a-identidade-de-venus-segundo-frege.html,
https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2022/05/alem-da-referencia-o-sentido.html.
[xi] Conforme Polónio, Russell via as
descrições definidas como conjunções existencialmente quantificadas, com uma
forma lógica própria. Sobre esse tema já falamos: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2023/06/quem-e-o-homem-no-canto-da-sala-bebendo.html,
https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2023/02/descritivismo.html,
https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2022/07/fontes-iniciais-da-filosofia-analitica.html.
[xii] Com apoio do Gemini (https://g.co/gemini/share/2db637646756), embora haja possíveis soluções para
este problema / paradoxo.
[xiii] Princípio da indiscernibilidade de
idênticos: ou “Discernibilidade de Não-Idênticos”? https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2025/04/superparticulares.html.
[xiv] Conforme Gemini (https://g.co/gemini/share/0cb21fa851a0):
o método é uma prova por contradição (reductio ad absurdum). Ele não constrói a
derivação lógica passo a passo que leva das premissas à conclusão. Em vez
disso, ele assume a negação da conclusão e tenta mostrar que essa suposição
leva a uma contradição com as premissas. Se uma contradição é encontrada, a
negação da conclusão é falsa, o que significa que a conclusão original deve ser
verdadeira.
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