quarta-feira, 25 de março de 2020

Critérios de Mesmidade[i]

Claudio Costa trata do que ele chama mesmidade, que é o conceito de identidade pessoal que faz com que uma pessoa seja a mesma ao longo do tempo, ou seja, sua identidade numérica. Isso definido, Costa busca critérios para essa identidade pessoal, que são abordados por teorias físicas e psicológicas, as primeiras se atendo à continuidade corporal ou cerebral, as segundas na manutenção de traços de caráter, recordações pessoais, etc.
Critérios físicos. Costa coloca em dúvida a permanência corporal, já que um corpo morto não é mais uma pessoa. Sobre a permanência do cérebro[ii], Costa se pergunta se seria um critério mais decisivo que o corpo.  Não necessariamente, pois se pensarmos em um cérebro mantido em formol ou o de alguém em coma, não se pode considerar que a continuidade do cérebro é exatamente o critério para identidade pessoal.
Teletransporte. Um experimento mental citado por Costa é o de Derek Parfit que trata do teletransporte de uma pessoa da Terra para Marte, em que não haveria continuidade corporal, mas que o filósofo considera ser a mesma pessoa. Peter Unger pensa diferente, dizendo que a pessoa original não existe mais, restando apenas uma réplica. Se, talvez a continuidade física substantiva não seja imprescindível, Costa mostra que ao menos uma conexão física causal deve ser necessária para relacionar a pessoa, o que seria verdadeiro no caso do teletransporte. Porém, se o teletransporte produzisse 5 cópias, por exemplo, não seria possível dizer que se trata da mesma pessoa (como no caso da ameba: 1 vira 2 que vira 4, etc.). Enfim, citando Robert Nozick, Costa conclui que ”a identidade é possível quando a continuidade física substantiva ou causal é unilinear”.
Critérios psicológicos. O ponto crucial, que Costa atribui a Locke, é o da memória pessoal, ou seja, sei que sou eu até onde vão minhas lembranças sobre mim. Contudo, Costa ressalta que o caso de alguém que perca sua memória, porém guarde traços psicológicos pode facilmente mostrar ser a mesma pessoa. E ilustra com o caso do motorista de Lady Di que perdeu a memória no acidente, embora saibamos que se trata dele mesmo e podemos até informa-lo disso. Assim como o critério da continuidade corporal [objetiva], a permanência da memória pessoal [subjetiva] não é critério suficiente para a identidade pessoal.
Por fim, Costa cita alguns casos onde a memória pessoal não seria relevante, quando, por exemplo, em um teletransporte a memória de Arafat fosse trocada com a de Sharon, isso não os faria perder sua identidade pessoal, porém provavelmente causaria algum desconforto. Muito embora, acrescenta Costa, a memória pessoal deveria ser confirmada por outra pessoa para que de fato pudéssemos comprovar que se trata da mesma pessoa, ou seja, ela seria um pressuposto epistêmico.
Critérios mistos. Costa então propõe uma regra P baseada nos dois grupos anteriores: A e B. Define-se:
Grupo A (critérios físicos):
1.      Continuidade física substantiva
2.      Conexão física causal
Grupo B (critérios mentais):
1.      Persistência da personalidade e caráter
2.      Persistência da memória proposicional e de habilidades
E a Regra P: uma pessoa pode ser considerada a mesma quando ao menos um critério de cada grupo estiver sendo suficientemente satisfeito.
A regra é maximizada quando temos todos os critérios aceitos e se degrada aos casos que quase não sabemos decidir. Ou seja, conclui ele, não há uma condição objetiva para analisar a questão da identidade pessoal.



[i] COSTA, CLAUDIO. Filosofia da Mente, p. 38 e ss. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005. (Passo-a-passo; 52)
[ii] Que teria prioridade sobre o corpo, conforme o exemplo de Sydney Shoemaker da pessoa chamada Brownson.

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