De
como a matemática inspirou a metafísica [i]
Século VI. De
acordo com Vargas, metafísica e matemática surgiram simultaneamente na Grécia,
no século VI a.C., embora a matemática já existisse no Egito/Mesopotâmia como
uma sabedoria instintiva dos papiros egípcios e babilônicos, uma arte de
cálculo e para resolver problemas.
Por outro lado, a matemática grega era baseada em
proposições lógicas e, tanto ela como a filosofia jônica, eram saberes
teóricos. Teoria que significava ver além das aparências, pelos olhos do
espírito. É a episteme teoritike, que trata do que é perene e imutável, seja a arché,
physis, ideia ou substância. Em uma ciência sobre o que é o estável da
realidade, os objetos matemáticos (figuras, números) satisfazem essa crença.
Naquela época, havia um misticismo relacionado com a
matemática que, absorta em uma atmosfera de mistério, tinha aulas secretas e a
saudação do número 4 como sagrado. A ordem religiosa dos matemáticos acreditava
na separação de corpo e alma e na reencarnação. Associada a ela surge uma
metafisica com teoria da realidade radical, inspirada na harmonia numérica,
musical e celestial.
Vargas cita ainda uma relação com o xamanismo, que
trazia as aventuras de Orfeu, a religião de Dionísio, libertação da alma,
possibilidade de ver o futuro e perfeição eterna. A physis perfeita e eterna
subjacente às aparências do mundo permite o surgimento da teoria dos números e
da raiz da realidade. Entretanto, se a união da geometria com a metafisica tem
como base o que se disse, ela entra em crise com a descoberta dos irracionais,
pois incomensuráveis.
Século V.
Vargas, por conseguinte, salta 100 anos para abordar Eudoxo e a teoria das
proporções. O século V é o das tragédias gregas, da Guerra do Peloponeso e das
invasões persas. Também de avanços na geometria, com teoremas independentes
sobre as propriedades exatas das figuras planas. E, dado isso, a criação do
sistema lógico postulacional dedutivo com a apagoge, a dedução
geométrica.
No século V, os pitagóricos convertem as proporções,
figuras, linhas contínuas, isto é, ideias geométricas em números discretos. É a
passagem das proporções harmoniosas à teoria dedutiva.
Século IV. Aqui,
além de novos teoremas, aparece a filosofia de Platão e um modelo analítico,
como na República, em que se pode “ver” imagens (figuras) como ideias (ex.
diâmetro). Esquematizando o que Vargas nos traz.
Dianoia |
Nous |
Matemática:
conhecimento dedutivo de imagens |
Realidade:
conhecimento intuitivo das ideias. Ideias:
entidades reais, perfeitas. |
Inteligência
discursiva |
Nous:
mundo do saber (ideias) |
Então, a matemática inspira a metafísica e temos a transição
do número (Pitágoras) para a ideia.
Por fim, Aristóteles.
A marcha continua, Platão postula a perenidade indelével dos objetos da
matemática. Theudio, precursor de Euclides, já tinha um tratado de Geometria,
com entes geométricos geradores de princípios.
Aristóteles aprendeu os métodos analíticos, onde
ideias contêm outras ideais, para usar na doutrina do ser, tendo a geometria
como prolegômeno da metafisica. Dos postulados para as proposições, há
inspiração metodológica.
Porém, uma vez erigida a metafísica, ela esclarece os
princípios da geometria e ciências particulares. E o objeto platônico (eidos) é
abstraído em uma forma aristotélica. Durante Aristóteles, foi sendo edificado
um sistema postulacional à maneira dos Elementos de Euclides. Há dedução de um
teorema a partir de princípios e a geração dos entes vivos a partir da semente.
[i] Conforme A matemática e a metafísica grega, Capítulo 3 de Vargas, M. (1994). Para uma filosofia da tecnologia. São Paulo: Alfa Omega.
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