Você me belisca, esse estímulo sobe ao cérebro, lá ocorre algo e
eu grito. Lá pode ter havido duas situações: a produção de um estado mental
associado ao beliscão ou simplesmente um comando de volta de gritar.
Aparentemente, imaginamos que houve um estado mental consciente organizando o
recebimento e a devolução dos estímulos, mas Searle argumenta que não
necessariamente. Estamos no campo das relações causais entre processos
cerebrais, processos mentais e comportamento exterior. Por outro lado, alguém
poderia me beliscar, muito forte, e eu não gritar, mas estar consciente, como
ocorre em algumas síndromes de paralisia, o que mostraria certa independência
entre comportamento e mente perfeitamente factível. A capacidade do cérebro
causar consciência é diferente da capacidade do cérebro causar comportamento. E
mais: os fenômenos mentais são subjetivos e somente atestados pela primeira
pessoa; alguém de fora (uma terceira pessoa) não conseguiria comprovar minha
consciência em alguns casos pela observação empírica. Através de experimentos
de pensamento, Searle argumenta que o comportamento exterior pode ser semelhante no caso de possíveis robôs que tenham consciência, ou seja, inconscientes.
E, no que tange à ontologia da consciência, o comportamento é irrelevante.
Mas, então, haveria certos fenômenos que não seriam observados
pelo método empírico? Antes de tudo, há que se diferenciar um sentido
ontológico que significa fatos reais no mundo e um epistêmico, que é da ordem
da lógica ou da matemática. Do ponto de vista ontológico, os fenômenos podem
ser verificados somente por uma primeira pessoa e não pela terceira pessoa. Por
exemplo, ao examinarmos um cão, percebemos que sua fisiologia e fisionomia são
semelhantes às nossas, que um beliscão causa um grunhido e podemos
supor que eles possam ter uma consciência parecida com a nossa, embora o
caráter qualitativo, subjetivo, não seja acessível a padrões ou métodos em
terceira pessoa, mas por métodos indiretos (de causação) obtemos o mesmo
resultado empírico. Contudo, pela neurofisiologia poderíamos chegar a alguns
experimentos que indicassem que certos fenômenos neurofisiológicos
indicam uma presença ou não de consciência ou de um tipo dela, o que permitiria
uma explicação empírica para algo subjetivo por um método objetivo indireto. Assim, um fenômeno
neurofisiológico x poderia indicar certo estado mental. Isso conseguido pelo
método: mesma causa, mesmo efeito. A solução funciona logicamente, mas isso
seria suficiente? Afinal não seria o comportamento o que determinaria a
existência de consciência em outros seres, mas uma correlação com a nossa
conexão causal. Obviamente, nesse caso, a ontologia não serviria para nada.
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(*) SEARLE, J. R. Rompendo o domínio: cérebros de silício, robôs conscientes e outras mentes. In: A redescoberta da mente. Trad. E. P. Ferreira. São Paulo, Martins Fontes, 1997.
Final do primeiro parágrafo: possíveis robôs que tenham consciência, ou sejam inconscientes.
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