Haveria na moral grega um recado do
universo, uma moral cosmológica: fazer-se-ia de acordo com as suas propensões, seus
atributos. Agir-se-ia de acordo com sua virtude. Porque no universo tudo teria um por
que, uma finalidade. O vento refresca, a vaca dá leite, o desenhista desenha.
De acordo com Sócrates: conhece-te a ti mesmo. Observe suas qualidades e faça
de acordo com elas, esse seria o mandamento cósmico, a moral seria fazer de
acordo com a sua constituição. Kant não entenderia dessa forma: agir-se-ia de
acordo com a vontade. Tenho virtudes, mas depois disso, tenho uma vontade que
direciona essa virtude. As virtudes em si não teriam valor, o que teria valor seria o
que faço com elas, como eu as usaria e como elas teriam efeitos nos outros. Para os
gregos não existiria os outros, existiria uma necessidade cosmológica.
Se os gregos se orientavam pelas
virtudes, seria quem tem mais virtudes que se destacaria, os que teriam menos virtudes
serviriam aos que tem mais. Haveria uma diferença aí (de natureza), haveria um
privilégio, uma seleção, haveria uma moral aristocrática. Para Kant não, decidir-se-ia
pela vontade, pelo uso da razão e esta seria acessível a todos. Nesse momento, haveria uma igualdade como que a nivelar certa diferença de natureza e, a
partir daí, seguir-se-ia como se pode. Até aqui dois rompimentos.
A terceira ruptura viria da moral
cristã. Nela, seguiríamos as leis de Deus ou porque seríamos tementes a Deus -
teríamos medo da não obediência e de um castigo eterno, ou porque quereríamos
uma bem temperança eterna, quereríamos garantir um futuro promissor à nossa
alma. Agir-se-ia movido por um causa exterior. Mas Kant teria pregado uma moral
descompromissada, ao agir não pensaríamos nas consequências benéficas para nós,
agiríamos livres de influência exterior e em prol do outro.
Estamos no campo prático, mas e o
campo teórico?** A razão teórica busca o conhecer e há limites nesse conhecer.
A razão teórica fica no limite do fenômeno e da coisa-em-si e se perde em
antinomias. Haveria liberdade ou seríamos totalmente determinados? Como se dão
as séries, há umas sem causa, com uma causa em si?*** A razão teórica não se
decide, mas a solução viria pela razão prática. Parece que seria a própria
razão a responsável por nossa ação, no campo prático (conforme vimos acima,
conforme estamos supondo). O sujeito da razão prática seria autônomo em relação
ao objeto, haveria uma vontade autônoma. Parece que esse é o caminho que
deveremos tentar desvendar, caminho que será enfatizado pelo idealismo alemão
(com o primado da razão prática), mas com Schopenhauer varrendo esse caminho
para debaixo do tapete e apontando para uma heteronomia, com a vontade
determinada.
_____
* De um vídeo aula do professor Clóvis Barros
Filho.
**
A partir de agora se argumenta conforme 1ª aula de Filosofia Geral IV, prof. Eduardo Brandão, 22/02/2016.
*** Precisamos tirar a poeira desses conceitos
kantianos, relembrá-los, reforçá-los...
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