terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Pontuando a moral kantiana*

Haveria na moral grega um recado do universo, uma moral cosmológica: fazer-se-ia de acordo com as suas propensões, seus atributos. Agir-se-ia de acordo com sua virtude. Porque no universo tudo teria um por que, uma finalidade. O vento refresca, a vaca dá leite, o desenhista desenha. De acordo com Sócrates: conhece-te a ti mesmo. Observe suas qualidades e faça de acordo com elas, esse seria o mandamento cósmico, a moral seria fazer de acordo com a sua constituição. Kant não entenderia dessa forma: agir-se-ia de acordo com a vontade. Tenho virtudes, mas depois disso, tenho uma vontade que direciona essa virtude. As virtudes em si não teriam valor, o que teria valor seria o que faço com elas, como eu as usaria e como elas teriam efeitos nos outros. Para os gregos não existiria os outros, existiria uma necessidade cosmológica.
Se os gregos se orientavam pelas virtudes, seria quem tem mais virtudes que se destacaria, os que teriam menos virtudes serviriam aos que tem mais. Haveria uma diferença aí (de natureza), haveria um privilégio, uma seleção, haveria uma moral aristocrática. Para Kant não, decidir-se-ia pela vontade, pelo uso da razão e esta seria acessível a todos. Nesse momento, haveria uma igualdade como que a nivelar certa diferença de natureza e, a partir daí, seguir-se-ia como se pode. Até aqui dois rompimentos.
A terceira ruptura viria da moral cristã. Nela, seguiríamos as leis de Deus ou porque seríamos tementes a Deus - teríamos medo da não obediência e de um castigo eterno, ou porque quereríamos uma bem temperança eterna, quereríamos garantir um futuro promissor à nossa alma. Agir-se-ia movido por um causa exterior. Mas Kant teria pregado uma moral descompromissada, ao agir não pensaríamos nas consequências benéficas para nós, agiríamos livres de influência exterior e em prol do outro.
Estamos no campo prático, mas e o campo teórico?** A razão teórica busca o conhecer e há limites nesse conhecer. A razão teórica fica no limite do fenômeno e da coisa-em-si e se perde em antinomias. Haveria liberdade ou seríamos totalmente determinados? Como se dão as séries, há umas sem causa, com uma causa em si?*** A razão teórica não se decide, mas a solução viria pela razão prática. Parece que seria a própria razão a responsável por nossa ação, no campo prático (conforme vimos acima, conforme estamos supondo). O sujeito da razão prática seria autônomo em relação ao objeto, haveria uma vontade autônoma. Parece que esse é o caminho que deveremos tentar desvendar, caminho que será enfatizado pelo idealismo alemão (com o primado da razão prática), mas com Schopenhauer varrendo esse caminho para debaixo do tapete e apontando para uma heteronomia, com a vontade determinada.

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* De um vídeo aula do professor Clóvis Barros Filho.
** A partir de agora se argumenta conforme 1ª  aula de Filosofia Geral IV, prof. Eduardo Brandão, 22/02/2016.
*** Precisamos tirar a poeira desses conceitos kantianos, relembrá-los, reforçá-los...

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