Resumo. Segundo texto da
série, resume outros aspectos da lógica elementar, como a lógica modal alética
e sua relação com a necessidade e possibilidade, a distinção entre operadores
modais de dicto e de re, a validade lógica, a epistemologia da verdade
necessária e contingente, o raciocínio indutivo e dedutivo, a importância das
provas e crenças na formação do conhecimento, o papel dos argumentos de
autoridade e os desafios das crenças fundamentais, finalizando com uma análise
das limitações da lógica aristotélica e seu impacto na validade dos silogismos[i].
Capítulo 7: Modalidade[ii].
A lógica modal alética surge a partir da clássica agregando-se necessidade e
possibilidade - operadores de formação de frases que não são verofuncionais[iii]. Lidando com modos de
verdade, uma frase necessariamente verdadeira, além de verdadeira, não pode ser
falsa, caso contrário é contingentemente verdadeira. A lógica modal ajuda a
esclarecer, então, se as verdades necessárias são verdades lógicas ou
matemáticas, ou se não são e por aí vai.
Ela se desenvolveu, no século XX, com a
linguagem dos mundos possíveis que já está presente na validade e não tem a ver
com a existência de realidades paralelas, mas com a aplicação da lógica
quantificada ao raciocínio modal. Conforme Polónio, um raciocínio é válido se e
somente se não há qualquer condição de verdade, ou mundo possível, em que a
conclusão seja falsa apesar de todas as premissas serem verdadeiras. Se uma
frase é verdadeira, ela o é no mundo atual, como as coisas são. Porém, para traduzir
a linguagem modal para a linguagem de mundos possíveis, um mundo deve ser
acessível a outro, uma possibilidade relativa definida como: “o mundo possível
β é acessível a α se e somente se toda a frase verdadeira em β é possível em α”,
quer dizer, nas condições em que tudo o que é verdadeiro em beta é possível
em alfa, beta é acessível a alfa.
Os operadores modais aléticos podem ser de
dicto (do dito – aplicada sobre a proposição) ou de re (da coisa – sobre
o predicado da coisa), envolvendo aspectos sintáticos e existenciais. Há uma
questão envolvendo o escopo dos operadores modais (necessidade ou
possibilidade) em relação aos quantificadores (existe e todo). No dito, o
operador modal aparece antes do quantificador como em "Necessariamente,
o Presidente do Brasil é brasileiro." – aqui há necessidade da proposição
completa. Na coisa, o quantificador aparece antes do operador modal como em “O
Presidente do Brasil é necessariamente brasileiro.”. No primeiro caso, não
importa muito o indivíduo, seu âmbito é menos forte.
Para além da análise de frases simples, a
distinção do dito e da coisa ajuda na definição da validade porque uma
definição de validade de re não é correta (forma válida e conclusão falsa [em
um mundo possível]), coisa que a de dicto é. Conforme o exemplo de Polónio, “Se
um argumento válido tem premissas verdadeiras, a sua conclusão será necessariamente
verdadeira” – foca na consequente, mas há argumentos cuja conclusão não é
necessariamente verdadeira. Já “Necessariamente, se as premissas de um
argumento válido forem verdadeiras, a sua conclusão será verdadeira” abrange
toda a frase, não só a conclusão, mas na relação entre premissas e conclusão. A diferença reside unicamente no escopo
do operador modal, e esse detalhe sintático é o que define o próprio conceito
de validade lógica.[iv]
Conforme dito na nota 3, Polónio retoma a
distinção entre por um lado a natureza da verdade em si e por outro como
conhecemos essa verdade. Ora, uma verdade pode ser necessária ou contingente, a
depender de seu valor nos mundos possíveis. Já o sujeito conhece uma verdade
seja a priori ou a posteriori, isto é, se independentemente de informação
sensorial ou experiência. Isso no campo da episteme, mas semanticamente, nas
modalidades do analítico e do sintético.
Nesse ponto destaca-se o argumento ontológico de Santo Anselmo, como
sendo um salto de uma possibilidade meramente conceitual para uma inferência
substancial a respeito da existência de Deus. Citando: “A mera possibilidade
conceitual é apenas o que não se sabe conceptualmente, e do que não se
sabe há que fazer silêncio inferencial porque daí nada de substancial se
conclui validamente.”
Capítulo 8: Além da linguagem.
Aqui Polónio trata da indução com um tipo de raciocínio não dedutivo e que vai
buscar uma realidade extralinguística, além das condições de verdade. Ocorre
que os raciocínios indutivos não se fundam em premissas e conclusões, isto é,
na validade que tratamos no texto anterior; ele tem graus, como é o caso de generalizações
e previsões, mas, no âmago de um apoio indutivo está a probabilidade que uma
conclusão pode ser verdadeira se as premissas também o forem.
Porém se nosso conhecimento é obtido
raciocinando-se, Polónio lembra que é a crença que liga o agente com a
realidade: ela não é factiva como o conhecimento de verdades[v]. Mesmo para uma crença
verdadeira é preciso que haja prova para que se torne conhecimento e provar é
um processo falível. Polónio contextualiza a prova como algo que contribui para
a conclusão, mas não evita erros, então devemos sempre tentar detectá-los e
buscar novas informações para corrigi-los e que sejam relevantes para o
raciocínio indutivo. Isso mostra que as provas indutivas são dinâmicas, ao
passo que as dedutivas são estáticas, embora Polónio frise que, mesmo em
raciocínios dedutivos acabamos por obter suas premissas indutivamente,
mostrando que a validade não é tudo o que conta.
Interessante notar que há várias fontes de
provas para nossas crenças, como memória, sentidos e compreensão e elas devem
ser contrastadas visando descobrir erros, tendo em vista a responsabilidade epistêmica.
Porém, provas favoráveis a crenças podem ser falsas, como enfatiza Polónio e
levando em conta que se há provas, há contraprovas. Mesmo nas deduções podemos
tomar princípios lógicos errados fazendo com que o método de prova deva ser sempre
revisto.
No mais das vezes, a crença de outra
pessoa serve como prova, caso de especialistas e argumentos de autoridade. Que
Nero apeou fogo em Roma é coisa que se sabe indiretamente por historiadores (crença).
Se o conhecimento é muito especializado,
há necessidade de mais especialistas, conforme prossegue a argumentação de
Polónio. Mas, mais indireto, já que nossas crenças dependem das crenças deles e
depende de que várias pessoas as examinem em busca de erros e comuniquem seus
resultados.
Desidério mostra, por outro lado, que pode
haver argumento de autoridade falacioso se baseado em prova que não é boa, isto
é, não é cogente. A autoridade deve ser epistemicamente
relevante, coisa que pode ser verificada pela reprodução das provas que ela
utilizou. Se não há conhecimento factual ou biográfico relevante para a crença,
devemos suspendê-la. Além do que nós devemos ter atenção na ocorrência de uma
disparidade epistêmica entre o especialista e o leigo, o que pode distorcer o
entendimento e aceitação das provas.
Na sequência, Polónio enfrenta
dificuldades relativas à crenças fundamentais que baseiam as demais, sejam pelo
fato de “só” serem comuns, ou quando se assume de início uma falsidade. Devemos
sempre nos valer das contraprovas, das revisões e da busca de crenças mais
fortes. Crenças falsas podem se originar tanto de informações erradas como de nossa
interpretação errônea. Esse ponto é muito sensível, em nossa opinião, porque,
conforme o resumo de Polónio, há sempre uma relevância estatística a que somos
expostos: há pessoas do nosso círculo nos fornecendo crenças; há relevância de
crenças de pessoas influentes; há malevolência epistêmica na mídia quando oculta
seus objetivos; há dificuldade em confrontar crenças estatísticas, mesmo com
provas que as refutem.
Assim como nas crenças estatísticas, há
crenças que vemos como causais por se valerem de eventos sucessivos, mesmo que
repetidos, mas que não tem relação probatória – deveriam ser motivo de investigação
científica. Mas, por fim, há a racionalização, isto é, processo de sustentar
uma crença suprimindo-se provas e visando passar uma impressão de responsabilidade
epistêmica.
Apêndice: Lógica aristotélica.
O apêndice aborda o silogismo aristotélico que se vale de axiomas que não são provados.
Nossos autores enfatizam as limitações da lógica aristotélica, mesmo que tendo
perdurado até o século XIX. Ela confunde, por exemplo, um termo sujeito (todo
grego) com um sujeito particular (Sócrates) sobre o qual se predica. Ela também
exclui termos vazios, impedindo que se raciocine com eles. Alguns desses fatores,
somados com regras que foram criadas para determinar a validade dos silogismos,
embora não constitutivos dela, limita bastante a silogística aristotélica fazendo
com que não se aplique a raciocínios indutivos em geral.
[i] Resumo de Lógica Elementar:
Raciocínio, linguagem e realidade de Desidério Murcho, por Artur Polónio em
https://criticanarede.com/logicaelementar.html.
Continuação de Aspectos de Lógica Elementar - parte 1: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2025/09/aspectos-de-logica-elementar-parte-1.html
[ii] Aqui trata-se de um resumo do
resumo de um assunto complexo que precisa ser aprofundado futuramente.
[iii] Se a modalidade alética é
desenvolvida tendo em mente a necessidade e possibilidade genuínas, isto é, aos
modos das próprias verdades, há as modalidades semânticas do analítico e
do sintético e epistémicas do a priori e do a posteriori que dizem respeito aos
modos como são conhecidas.
[iv] Com a ajuda do Gemini: https://g.co/gemini/share/a1e7c0417fd5.
[v] Lembrar do conhecimento como crença verdadeira justificada: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2023/11/teses-quineanas.html.