segunda-feira, 29 de abril de 2024

Pelo fim das opiniões filosóficas

Tenta pôr um fim na opinião filosófica que é um fim em si mesma[i]

Opiniões filosóficas. A princípio uma opinião filosófica é uma opinião que visa “desmistificar” algo, isto é, visa esclarecer, porém o faz procurando mostrar a essência daquele algo. “Cogito ergo sum”, ou, “penso, logo existo” é todo o fundamento da filosofia cartesiana que parte da dúvida para negar o mundo exterior. Ora, esclarece que não se pode confiar nos sentidos, mas, por outro lado, mostra nossa essência mental. Uma outra opinião filosófica pode nos ajudar a entender que devemos fazer o bem, mas para isso ela se baseia em uma máxima universal que se funda na essência moral. Já postular que Deus é a natureza esclarece que ele não é transcendente posto que sua essência é imanente.

Leis. Isso tudo são usos de linguagem para fins filosóficos. Entretanto, são opiniões que, uma vez postas, ficam à mercê de argumentação contrária. Mas por que estamos falando de “opiniões”? Isso não seria rebaixar a nobre filosofia? De maneira alguma, isso seria colocá-la em lugar útil e promissor. Porque se tratássemos opiniões filosóficas como leis filosóficas, elas não seriam passíveis de contestação, mas leis, pelo seu próprio caráter, ou são imposições ou têm total comprovação empírica. Uma lei filosófica é um absurdo em si mesmo, se imposta. Se, ao contrário, é empírica, não é filosofia, mas ciência.

Uso filosófico da linguagem. Então, uma opinião filosófica é um uso filosófico da linguagem. Mas esse uso não é promissor porque ele está sempre buscando esconder uma essência travestida em esclarecimento. Por isso, denunciemos o uso filosófico da linguagem ou o uso da linguagem para fazer filosofia. O uso da linguagem para expressar opinião filosófica é um uso especulativo e estéril. É um uso que arrebanha intelectuais que se digladiam por detrás de livros e ideias provisórias, senão dogmáticas.

Terapia. Se não de se pode falar se deve calar? De maneira alguma e o próprio mestre depois ensinou: devemos falar e muito, mas denunciar esses usos, que não passam de confusões. Na vida cotidiana temos nossas opiniões e um conjunto de crenças que muitas vezes nos levam a uma vida angustiante. Enxergamos o mundo de tal forma que essa interpretação se mostra claramente equivocada, se analisada. São confusões que devem ser resolvidas por uma boa terapia com procedimentos e métodos terapêuticos que podem nos ser úteis tanto no dia a dia como em filosofia.

Uso inadequado da linguagem. É justamente essa visão de terapia filosófica que estamos tentando entender da proposta wittgensteiniana. Conforme Plínio: “... as investigações filosóficas (...) nos farão reconhecer que o suposto conhecimento filosófico é apenas um produto de um uso inadequado da linguagem”.[ii] Não parece claro e cristalino? Só há conhecimento (sic. opinião) filosófico porque fazemos um uso inadequado da linguagem. Se queremos usar a linguagem para o seu fim adequado, não devemos usá-la para fazer filosofia. Mas não devemos fazer filosofia? Devemos! Mas como uma atividade de denúncia do uso inadequado da linguagem e de esclarecimento do uso correto da linguagem, mas um uso que não se mostre dogmático.

Pragmática. Um uso terapêutico no campo filosófico é um uso que não deve ser dogmático, já que visa elucidá-lo. Mas um uso terapêutico pode acabar pode ter teses positivas e cuja proteção se poderia dar pela pragmática, conforme o projeto de Arley Moreno[iii] e seu compromisso com “teses filosóficas não dogmáticas” e que enfoca a gramática dos usos das palavras sem formular hipóteses sobre sua justificação e sem afirmar nada sobre o que é, mas sobre o que é possível ser.

É um campo a ser explorado.



[i] Essa é uma tentativa de manifesto baseada em terapia e ceticismo a partir dos textos que temos lido e que, em geral, resenhamos nesse blog. Coisas que temos olhado: FILOSOFIA E TERAPIA EM WITTGENSTEIN, de João Carlos Salles Pires da Silva e WITTGENSTEIN E O PIRRONISMO: SOBRE A NATUREZA DA FILOSOFIA de Plínio Junqueira Smith.

[ii] Analytica, volume 1, número 1, 1993, pg 160.

[iii] Analytica, volume 9, número 2, 2005, pg 104.

Nenhum comentário:

Postar um comentário