Traremos
aqui dos principais aspectos do capítulo I de O Conceito de Tecnologia,
de Álvaro Vieira Pinto (Rio de Janeiro: Contraponto, 2005), intitulado Em
face da “era tecnológica”.
Vieira
Pinto começa com a noção de maravilhamento que caracteriza nossa “era
tecnológica”, mas o faz em contraponto ao maravilhar-se dos gregos em relação à
ordem perfeita da natureza, enfatizada pela debilidade das forças produtivas. E
isso é fundamental em sua análise, a noção crítica que se faz observando a
história, em oposição ao que ele chama de atitude ingênua que se
maravilha com suas próprias obras e se vê embasbacada com a ciência moderna.
Porém, há, por traz disso, uma ideologia de propaganda das classes
dominantes que, nessa sacralização do presente, desmobiliza processos de
transformações sociais e políticas.
De
acordo com Vieira Pinto, o conceito de era tecnológica induz um discurso
enganador pois, ao mesmo tempo em que exalta nossa época, concentra os benefícios
nas camadas dominantes que se outorgam os provedores da tecnologia e um valor
ético positivo a ela associado, um privilégio de nosso tempo. Não obstante, as
criações estão nos grandes centros e relegam aos países subdesenvolvidos o
consumo dos produtos e, assim, aumentando a espoliação. Isso posto, o papel dos filósofos
nos países pobres deve ser de uma consciência filosófica difícil de ser
atingida, pois também reproduzimos as ideias. Consciência que, além do técnico,
deve defender os recursos e se debruçar sobre os interesses antagônicos que se
dão a partir de categorias dialéticas.
Ou
seja, a filosofia da tecnologia deve olhar o processo histórico superando
a visão maniqueísta, pois o novo é recorrente. Daí que a tecnologia avança em
seu processo produtivo pelo trabalho humano em relação com a natureza. Se, no
início, se fazia a análise da máquina que ajuda a superar as dificuldades da
realidade, agora a reflexão se dá sobre a técnica e a capacidade de criação do homem
que as projeta.
E
é a faculdade de projetar que nos distingue, não só como um conceito
existencialista, mas a partir da transformação da realidade material
visando um novo ser. É um trabalho mental de perceber conexões que podem projetar o novo, criar um objeto inexistente. É uma capacidade que evoluiu
biologicamente, mas também exercício social que está por detrás do caráter técnico
de toda ação humana, que visa melhores maneiras de prover as necessidades por
meio do projeto.
Então,
o projeto visa a produção, que é essência de nossa realidade, pois não
somos consumidores da natureza como os outros animais. Ela se dá pela técnica
que nos leva a “obedecer às qualidades das coisas e agir de acordo com as leis
dos fenômenos objetivos” e nos faz um animal técnico que sempre existiu, seja
no polimento da pedra ou na Revolução Industrial. A tecnologia se vale do
trabalho intelectual que age pela abstração do mundo que em cada tempo e lugar
forma a cultura da época. Ela avança por invenções técnicas feitas de continuidade
quantitativa e saltos qualitativos, que enriquecem a prática, mas cada
descoberta também pode gerar incerteza e perigo, por isso, a tecnologia deve
ser analisada sem estigma e nem ser endeusada, pelas categorias lógicas do
pensamento crítico.
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