Russell
inicia comparando o conhecimento de coisas, que se referem a algo, com o
conhecimento de verdades que está sujeito ao erro. Ou seja, as coisas
conhecidas existem, não há como negar, porém o conhecimento de verdades envolve
um dualismo, já que uns podem acreditar em algo errado na mesma intensidade em
que outros podem acreditar em algo certo. Para analisar essa questão ele estuda
primeiro o significado da verdade e da falsidade.[i] Então,
Russell enumera três pontos na busca da natureza da verdade: 1) uma teoria da
verdade deve admitir seu oposto, a falsidade; 2) para haver verdade e falsidade
é preciso mais do que somente matéria no mundo, é preciso crenças e afirmações
das quais se obtêm verdade e falsidade; 3) apesar da ligação da verdade ou
falsidade com a crença, elas não são qualidades intrínsecas da crença, mas a
respeito de algo que a crença se refere.
Russell
comenta a visão de muitos filósofos de que a verdade é algo que corresponde à
ligação da crença com o fato, corroborando a ligação com algo externo e
nomeando como a teoria da coerência[ii],
quando a falsidade é a falta de coerência com o conjunto de nossas crenças. Porém,
Russell salienta que não há apenas um conjunto coerente de crenças usando como
exemplo a ciência, onde há mais de uma hipótese para um conjunto de fatos de
determinado assunto, assim como em Filosofia, que também pode haver mais de uma
hipótese capaz de suplantar todos os fatos, por isso a coerência falha como
definição da verdade. Além do mais, a coerência pressupõe as leis da lógica,
p.ex., a lei da contradição que, se falsa, "nada será mais incoerente com
qualquer outra coisa". Dito isto, ele conclui que a coerência seria mais
um teste da verdade e não se confundindo com a própria verdade.
Russell
então retorna à correspondência com os fatos como sendo a natureza da verdade,
ressaltando que não significa uma relação da mente com um objeto, senão não
haveria seu oposto, a falsidade. Aprofundando essa correspondência, ele mostra
que, às vezes, a crença não se refere a nenhum objeto em outras a inúmeros, nas
palavras do filósofo, tratando da crença ou do julgamento:
What is called
belief or judgement is nothing but this relation of believing or judging, which
relates a mind to several things other
than itself. An act of belief or of judgement is the occurrence
between certain terms at some particular time, of the relation of believing or
judging.
Segundo
Russell o ato de julgar envolve um sujeito, a mente, e objetos que são os
termos que são julgados. Eles são os constituintes do ato de julgar e tem um
sentido ou direção, ou seja, há uma ordem entre eles. Para ele, qualquer
relação entre sujeito e objetos os une em um todo complexo, e o inverso,
onde há um objeto complexo há relação unindo seus constituintes. Mesmo dentro
dos objetos pode haver outras relações dependendo da relação primeira que é a
crença ou julgamento. Já acreditar falsamente invalida as relações dos objetos.
Russell
encontra então a definição de verdade: quando a crença corresponde a uma
unidade complexa formada pelos termos, a relação e a mente.[iii] Assim,
verdade e falsidade são propriedades extrínsecas das crenças e no limite não
envolvem a mente, somente os objetos das crenças, como ele diz: “Hence we account simultaneously for the two
facts that beliefs (a) depend on minds for their existence, (b) do not
depend on minds for their truth”. A verdade é a correspondência entre
a crença e esse fato composto pela unidade complexa e a falsidade aparece
quando não há tal fato. Porém, verdade e falsidade não são criadas pela mente,
mas a mente cria crenças feitas verdade por um fato.
* Bertrand Russell, Problems of Philosophy. TRUTH AND FALSEHOOD. Acessado
em 9/7/2019: http://www.ditext.com/russell/rus12.html.
Ver o seguinte
fichamento e os anteriores: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2019/07/graus-de-autoevidencia.html.
[i] Importante ressaltar que o
enfoque de Russell aqui é na busca do que é verdade e falsidade e não de quais
crenças são verdadeiras ou falsas.
[ii] Em algum momento deveríamos
confrontar a teoria do conhecimento de Russell com Descartes, já que ele põe em
dúvida o conhecimento oriundo dos sentidos (sujeito ao erro). Já Russell aqui
parece fazer o oposto.
[iii] Esse complexo parece uma coisa
que precisará ser mais bem investigado ontologicamente.
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