quinta-feira, 15 de setembro de 2016

O que é estrutural

Dizer que algo é estrutural (veja aqui conceituação do racismo estrutural) é dizer que faz parte do humano e constitui o sujeito (e isso não é marxista e tampouco de esquerda, embora pudéssemos pensar em uma análise estruturalista do materialismo histórico). O sujeito está sempre inserido em relações dadas de antemão por estruturas (o movimento estruturalista pode ser explorado aqui).
Mas não é isso que queremos abordar. Gostaríamos de retomar do início e verificar o estrutural pela chave psicanalítica freud-lacaniana[1] de maneira embrionária ainda (não trataremos do desejo). O campo do humano é o campo do simbólico, da linguagem. Porém, ao nascermos e enquanto bebês, não nos desenvolvemos em um percurso evolutivo biológico, mas nos constituímos a partir do discurso dos outros: da mãe, do pai, etc. Já há um discurso estabelecido em um campo simbólico historicamente constituído e é ele que nos constitui e por ele que adquirimos novos conhecimentos que nada mais são do que rearranjos dos conhecimentos já estabelecidos e encarnados nos outros.
A psicanálise lacaniana divide a psique no simbólico, imaginário, e real. O simbólico como estamos destacando é o campo que recorta o real e que permite sua significação pelo discurso e também a intersubjetividade. Esse é o campo humano que é caracterizado como o Outro. O real não é acessível, o real é o resto, a sobra do discurso. Isso porque não há uma natureza humana; ela foi perdida na constituição do sujeito pelo discurso que cindiu a possibilidade do encontro com objetos puros, físicos. A partir do discurso então construímos objetos imaginários, formamos uma imagem do real que não é o real.
Mas o simbólico é estrutural porque ele provém do inconsciente. Freud cindiu a psique no consciente e no inconsciente (algumas lições podem ser consultadas aqui). Porém, o consciente é sobre determinado pelo inconsciente. O consciente forja um EU que não passa de uma ilusão que tenta agregar nossas representações. O inconsciente é o lugar dos desejos reprimidos, lugar de convivência entre o contraditório que foi recalcado pelo sujeito consciente. Daí que as nossas ações, nosso discurso, os sonhos são pautados pela imprevisibilidade da estrutura inconsciente que está por detrás não somente do conhecimento público compartilhado, mas também da própria constituição do sujeito que não é um organismo vivo, mas um corpo objetivado pelo simbólico.
Portanto, dizer que algo é estrutural é dizer que esse algo é o que nos constitui e está constituído no Outro. O estrutural é a linguagem que nos torna humanos. O estrutural é o inconsciente que pauta o consciente. O sujeito se assujeita no discurso do outro e assim é constituído. Diante disso[2], podemos concluir que estamos de posse de um quadro estrutural dado, abrangente, aculturado e que vitimiza quem chega. Mas também significa que temos que nos apropriar desse discurso para formamos um discurso nosso que vai constituir os outros, recíproca e inversamente. Significa que a luta se dá pela linguagem, no campo do humano e que só poderemos superar o estrutural partindo de um esforço muito grande de readequação dos significantes que circulam nas cadeias discursivas mais conservadoras.




[1] Baseado em FEUSP-EDF0294/201602 (prof. Douglas Emiliano Batista) e Lajonquière (de Piaget a Freud).
[2] Aqui já é nossa argumentação.

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