domingo, 5 de abril de 2015

Contra EAD. Uma análise no uso das tecnologias na relação sujeito-objeto, ou, professor-aluno.*

O uso da Razão permitiu ao homem criar objetos para superar os limites da Natureza. Entretanto, essa “lógica do objeto” poderia levá-los ao domínio deles sobre nós: eles poderiam nos dispensar de todas nossas atividades ou mesmo nos exterminar. A mesma possibilidade de extinção ameaça os professores: se a psicologia já diminuíra o seu papel transformando-o em “facilitador”, o ensino à distância os coloca em posição passiva frente ao processo educacional. Mas, como fica a presença real, corporal do professor? A lógica capitalista cria objetos que se adéquam ao que o sujeito quer, o desejo vira necessidade. Se Lacan considera que a relação sexual não existe porque não há relação satisfatória, é essa falta que estimula o desejo, ao passo que a necessidade vem da adequação do sujeito ao objeto, em uma relação completa que faz com que o sujeito perca seu interesse pelo outro. Ao que parece, quando a relação aluno-computador satisfaz, a relação professor-aluno tende a desaparecer.
 A polarização desejo versus necessidade transparece mais claramente quando Voltolini analisa as teorias da psicologia behaviorista e a psicanálise. O behaviorismo busca “naturalizar” o homem equiparando-o ao animal e aproximando-o do instinto e de modo que se oriente pela necessidade. Assim, o behaviorismo usa um método de conformidade, baseado em estatísticas de padrões de comportamento que adéquam às demandas dos contingentes populacionais. É o que denuncia Lacan no Discurso do Capitalista: partindo do objeto que cria necessidade, que possibilita a relação direta entre sujeito e objeto e tentando eliminar o desejo; relação esta que seria impossível – como a relação sexual. Para a psicanálise, por outro lado, é justamente o instinto precário do homem que abre espaço para o pulsional apontando para uma desnaturação humana que se afasta da natureza e cria suas próprias condições humanas. E Voltolini acentua que o objetivo do capitalista é criar o objeto que cause necessidade absoluta, assim como a dependência criada pelo narcotráfico.
Mas o que o behaviorismo procura instaurar ao aproximar os homens dos animais, ao trabalhar com mecanismos que visam o controle da população a partir de dados estatísticos gerias, em detrimento do particular que o dado não desvela, é apagar uma diferença fundamental entre eles: a linguagem, a fala que faz do homem animal político.
Trazendo para a educação: a relação professor-aluno não existe, não há objeto do instinto e, dessa impossibilidade, busco me relacionar com o outro. E mais: não há receita para a relação entre dois – o aluno ideal não é o aluno da prática assim como o professor ideal não é aquele que está na sala de aula todos os dias, embora o discurso tecnicista queira implicar uma complementaridade entre ambos e elucidar como eles “funcionam”, por meio de um discurso prescritivo que não se concretiza. Mas como a psicanálise resolve essa questão? “Em termos psicanalíticos é a transferência, o termo criado para dar conta do campo de engodo que se estabelece entre dois que se acham numa relação na qual qualquer cálculo que um faça sobre o outro é ao mesmo tempo vital e enganoso.” Transferência que exige que professor e aluno estejam pertos um do outro e que ambos se engajem no que Voltolini chama de “encontro” professores alunos, encontro que é vivo, imprevisível e improvisado.
E o EAD? A técnica, da estratégia capitalista, foge à palavra para controlar e buscar resultados mediante aquele contato com o objeto que supre necessidades e se opondo ao discurso que “engancha” os atores, discurso da linguagem que se afasta do objeto. Falando, nos desnaturamos e nos afastamos do instinto entrando no campo do pulsional e é na transferência que a palavra ganha vida, espaço de diálogo. É aí que o professor atua: não como reservatório de informação ou mediador, mas como partícipe do potencial transferencial.
-----------------------
Resenha – texto “A relação professor-aluno não existe: corpo e imagem, presença e distância” – Rinaldo Voltolini.


Nenhum comentário:

Postar um comentário