Procura mostrar como a consciência muda seu estatuto, na modernidade, de ontológico para lógico[i]
De um lado o racionalista Descartes, de
outro o empirista Hume e sintetizando-os, Kant. Esse é um esquema bem conhecido
e vejamos o recorte que faz Vitor Lima. O professor recapitula a sua abordagem da
alma/mente: nos gregos e medievais, valorizava-se a racionalidade humana, como capacidade
de nos diferenciar dos outros animais. Uma alma, tomando todos os seres, abrange instintos e desejos, mas quando a alma é vista sob o prisma racional do
intelecto e vontade, ali no final da Idade Média, já estamos delimitando o que
seria a mente.
Na modernidade, a mente passa desse
aspecto racional para o aspecto introspectivo, isto é, vista a partir de uma perspectiva
interna, da consciência. É a coisa pensante cartesiana. Isso mesmo, “res cogitans”
com atributos que diferem da coisa material, “res extensa”. Para Descartes,
somos seres pensantes.
Já Hume, via a questão por outro prisma. Para
ele o nosso conhecimento vem dos sentidos, da experiência e não é algo inato. É
uma abordagem baseada na percepção, seja pelo que nos vem de fora ou seja pelo
que pode ser percebido internamente, um tipo de percepção particular oriunda do
exterior, mas que se pode articular. Porém, diferentemente de um polo invisível que nos comanda, há uma mente com impressões e ideias, quais sejam, as percepções
que não incluem aí um "eu". O “eu” não é observável, tampouco, internamente. As
percepções são particulares, e o que as percepções percebem são só percepções,
não há "eu" lá. Quando Hume olha para dentro ele não vê o eu cartesiano e ele
o caracteriza como simplesmente um sensor interior, segundo caracterização. E o professor traz a seguinte citação: “Não há impressão do Eu e nenhuma ideia do Eu. Há apenas aglomerados
de impressões e ideias.”[ii]
De um lado, impressões e ideias, de outro
uma consciência acabada. Será, então, Kant que vai unir as duas concepções, e postular que o “eu penso” existe, mas não tem conteúdo, ele é a condição lógica para que
haja pensamento. Kant conceitua a mente nas capacidades cognitivas, de sentir
dor e prazer e a de desejar. O primeiro é analisado na Crítica da Razão Pura e
dividido em entendimento, razão e juízo. Se a razão é livre (especulativa), o
entendimento se guia pela experiência e forma conceitos dados pelas categorias.
Ele une os itens da percepção na consciência, numa autoconsciência, conforme já
postulava Descartes.
Segundo o professor Vitor, a câmera captura
os dados dos sentidos, mas não é consciente de si. Para Kant as percepções que nos
chegam pelo sentido, que são caóticas, se organizam pela apercepção, essa a
priori. Empírico, de maneira direta e transcendental, esse “algo” que organiza,
já que o mundo em si é desorganizado. Se o mundo é o mundo, cada ser percebe
seus efeitos de determinada maneira. Em nosso caso é um algo lógico e a priori.
Transcendental, mas não transcendente, dependente de outro mundo. A unidade da
experiência se dá pela síntese das intuições, não percebida empiricamente.
A apercepção ressignifica o eu penso, não
por observação direta que vê um algo, mas é um a priori que unifica e garante a
percepção. Se existe um "eu mesmo" consciente e que pensa, nada podemos dizer do
que ele é, embora saibamos que há necessidade de colocar a experiência nessa equação.
Na psicologia empírica, argumenta Vitor, a alma é um objeto do sentido interior
e na racionalista ela é o sujeito pensante. Ora, deve haver um "eu penso", uma autoconsciência
que acompanha os pensamentos, mas a razão pura tem paralogismos também, isto
é, falsos silogismos que permitiriam a inferência de um "eu" como coisa pensante.
Embora a razão prática vá readmitir determinados conceitos que a sua
epistemologia afastou e que trará diretrizes de como viver e agir.
[i] Seguindo o curso de Vitor Lima, esse
é o fichamento de Filosofia da Mente: alma na Filosofia Moderna (Parte 2), que
trata de Hume e Kant. Conforme https://youtu.be/xHH9yIpd6No,
em 30/11/2024.
[ii] Minuto 26.
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