Mostra que há um discurso privado, mental, anterior ao
discurso público no uso da linguagem pelos modernos[i]
Hacking se refere a Mill (1844) como ponto
de partida no tratamento da linguagem, porém por “razões menores”, como a
prevenção de erros ou destacando a importância das proposições. É um marco,
posto que antes dele havia o predomínio das ideias que não estavam diretamente
ligadas ao significado, conceito associado à análise da linguagem atualmente.
Então, a linguagem, na modernidade, era importante, mas em outros termos.
Para Hobbes (1651), a fala era uma
transferência do discurso mental ao verbal, cada discurso seguindo um fluxo
separado. Mas, o fluxo do pensamento seria pré-linguístico, isto é, depois era
verbalizado para que pudesse ser comunicado. Se, para Hobbes, era tarefa da
linguagem comunicar pensamentos, Berkeley também enfatizava seu papel em
despertar emoções e dissuadir ações, como que para despertar nossos pensamentos
nos outros.
Portanto, no século XVII, havia uma
preocupação em livrar o pensamento da linguagem que, pública, levaria ao erro. De
um lado o discurso verbal que era usado para comunicação e, de outro, o pensamento
verdadeiro, haja vista a proposição de Descartes de escrutinar as ideias. Hacking
acredita que não havia uma teoria do significado naquele tempo, mas uma teoria
da linguagem autodidata baseada no mental[ii]. E também não acredita na
divisão das teorias do significado, como a proposta por Alston, entre
ideacional, referencial e comportamental.
Na teoria ideacional, o significado de uma
palavra é a ideia em nossa mente que ela representa, isto é, quando proferimos
uma frase nos referimos à ideia de algo, como um evento (um churrasco), etc. Na
teoria referencial, o significado é o próprio evento e, no caso da
comportamental, se verifica o que as pessoas fazem ao ouvir palavras. Hacking
investiga com base nessas definições: Locke (40 anos depois de Hobbes), seria
ideacionista? Para ele, as palavras são marcas sensíveis das ideias, são signos
das ideias.
Para Hobbes, as palavras também são marcas
ou signos e os nomes não são das coisas, mas há dificuldade de atribuir uma
teoria do significado, pois, a definição de signo é outra. Aqui “significa” tem
o sentido de “precede”, como uma nuvem carregada precede a chuva – é como que
inferir o pensamento a partir do que é dito, não que ‘signifique”. Na verdade,
segundo Hacking, Hobbes tanto poderia ser ideacionista como referencialista,
pois uma palavra é dita depois de uma ideia e uma palavra produz (significa) no
ouvinte um pensamento, mas ela realmente significa o que se refere[iii].
Hacking está enfatizando uma dificuldade
de categorizar um discurso moderno sobre a linguagem, uma teoria do significado.
Ele chega a aproximar Hobbes de Grice, uma teoria comportamental que seria a
atual teoria intencional de Grice, quando o falante pretende que o ouvinte
infira o significado do que é dito. Insere-se no campo da comunicação e intenção
de comunicar. Portanto, ou Hobbes passou pelas três caracterizações em seus
textos, ou ele não possuía uma teoria do significado, isto é, tinha outras preocupações,
como uma teoria do pensamento.
Pensamento que é associado ao discurso mental,
às ideias, ao passo que agora tratamos a linguagem de um jeito novo. E as
palavras, que são signos das ideias, ideias estas que, no século XVII, queriam dizer algo que
Hacking tentará explicar nos outros capítulos do livro. Por fim, ele ressalta
que embora Hobbes seja reconhecido por sua teoria política, ele dá ênfase à
natureza humana e à comunicação, já que o animal político é animal faltante.
Analogamente, tanto indivíduos constituem um estado, quanto o discurso mental é constituído
antes do discurso público.
[i] HACKING, I. Por que a linguagem
interessa à filosofia? São Paulo: Editora Unesp, 1999. 2. O discurso mental
de Thomas Hobbes – p 23.
[ii] Aqui cabe relembrar que no
idealismo de Berkeley não existia matéria, todos os existentes eram mentais.
[iii] Omitimos as citações a Hobbes, se é o caso referir ao original.
Nenhum comentário:
Postar um comentário