segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Wittgenstein e a teoria da figuração

Das divergências do último e do primeiro Wittgenstein acerca da linguagem.

É comum um pensador ter rupturas ou divergências no cômputo geral de sua obra. Esse é o caso de Wittgenstein que, de acordo com Cavassane[i], tem uma abordagem diametralmente oposta a respeito da linguagem entre o Tractatus e as Investigações Filosóficas. Ao fim do Tractatus, redigido sob a influência de Russell e que aborda a natureza da proposição e da linguagem, Wittgenstein acreditou ter solucionado os problemas de filosofia [então suscitados por Russell]. Porém, após algum tempo afastado da filosofia, ele percebe que estava orientado a uma perspectiva da tradição filosófica pela via de Russell e que ali os problemas não estavam postos de maneira correta, portanto, decide criticar seu velho modo de pensar [e a tradição], agora nas Investigações.

O Tractatus Logico-Philosophicus. De acordo com Cavassane, a teoria da figuração é a que receberá a crítica mais contundente, posteriormente. Nela, Wittgenstein busca responder “Como é possível falar sobre o mundo?”. A teoria da figuração é uma teoria do significado linguístico, e Wittgenstein postula que é possível porque linguagem e mundo compartilham uma mesma estrutura lógica [a priori].

Ou seja, a linguagem afigura os fatos compartilhando a forma lógica, que é a forma do pensamento. Porém as frases da linguagem ordinária podem conter erros e, da análise lógica de uma frase, pode se extrair o pensamento nela contido. Daí surge a tese do indizível: somente podemos expressar fatos do mundo (sejam possíveis ou reais), conteúdos objetivos. Isso não vale para o subjetivo (ética, religião) nem formal (lógica, matemática), considerados místicos por Wittgenstein que crava: “Sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”.

A crítica ao Tractatus nas Investigações Filosóficas. Segundo Cavassane, Wittgenstein abrirá mão de dois pontos principais de sua teoria da figuração: o referencialismo para o qual uma palavra possui significado se ela corresponde a um objeto e o perfeccionismo lógico, trazendo a crença de que a linguagem representa o mundo fielmente e nisso consiste a verdade. Wittgenstein vai criticar o referencialismo argumentando que não é possível reduzir todas as palavras a nomes. Sobre o perfeccionismo lógico, o uso no Tractatus se se dá por palavras simples se referindo a objetos e isso traz a univocidade do significado que garante certa imutabilidade e evitando a perda de referência. Porém, Wittgenstein vai rever essa posição nas Investigações considerando a exatidão absoluta do significado um ideal inalcançável, já que dependente do contexto. E é essa impossibilidade de exatidão que implode a lógica como estrutura do pensamento, do mundo e da linguagem, colocando abaixo a teoria da figuração do Tractatus Logico-Philosophicus.

Wittgenstein localiza a correspondência entre objetos e palavras em Platão, que no Teeteto cita que nos referimos a elementos primitivos por seus nomes e que ela forçaria o isomorfismo. Ainda, a correspondência se da a partir dos substantivos, parte pequena das palavras. Mais além, a ideia do objeto simples parece ser criada a priori para se encontrar por conseguinte a proposição e sua análise.

Considerações finais. Ao se perguntar sobre como é possível falar sobre o mundo, Wittgenstein responde com a teoria da figuração, onde as palavras afiguram objetos e há um isomorfismo lógico entre frases e fatos. Porém, posteriormente, Wittgenstein percebe o viés orientativo da teoria da figuração baseado na tradição e que sua resolução não contribuiu para a verdadeira compreensão dos fenômenos da linguagem, então ele faz a crítica do pensamento inicial. Agora, não há uma exatidão entre mundo e linguagem e isso implode a possibilidade de mapeamento lógico. Deste modo, o que constitui a ruptura entre o primeiro e o segundo Wittgenstein é uma mudança de método: “O método puramente apriorístico do Tractatus é submetido a crítica e agora recomenda (em certo sentido) o método a posteriori de investigar os fenômenos reais da linguagem.”. Se afastando de Platão e da tradição, o segundo Wittgenstein se afasta de conceito e se aproxima do uso cotidiano.



[i] O que se segue é conforme A crítica de Wittgenstein ao seu Tractatus nas Investigações Filosóficas, acessado em 07/09/2020 no link: http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/ric/article/view/337. Artigo de Ricardo Peraça Cavassane.

Um comentário:

  1. ver post véio: https://www.reflexoesdofilosofo.blog.br/2019/02/como-resolver-problemas-filosoficos.html

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