É
tão difícil acreditar que somos corpos, mas o deslocamento livre e inconteste
nos faz menos racionais e o ir e vir surpreende e desarma. Tudo está em
perpétuo fluxo porque o nosso pouco tempo no mundo nos faz acreditar no
infinito. Mas não é nesses termos que nos devemos medir; medimo-nos pelas
aberturas que nos são impostas por nós mesmos. De repente, algo que estava aqui
já não está e, se o visávamos, agora tal intencionalidade esvaiu-se e nada há
de surpreendente, apenas nossa estrutura biofísica se afeta de maneira diversa.
A nossa pele, que é muito sensória, e demais órgãos afetivos sobrepõem-se a uma consciência
extravagante. Ela, sim, move-se sem se mover, mas movendo um corpo que se move
passionalmente. Subjaz um estado de constante interferência que qualquer inferência,
se estatisticamente acurada, não previne precauções.
Mas,
qual a estranheza? Ninguém nos enganou e nada nos prometeram, simplesmente o
vento soprou e espalhou o que estava assentado. O vento não é um, é múltiplo e dinâmico.
Sentimos, em nossa disposição física, sensações térmicas distintas que paralelamente se repelem e se associam mais parecendo um emaranhado de possibilidades
decompostas. Um dedo é muito mais do que um todo. Um dedo fala por si, toca por
si, reverbera por si. Um corpo com muitos dedos que sentem é um corpo precário quando
se pensa um corpo articulado. O que mais se articula é o pedaço mínimo que,
isolado, irrompe em um efeito não linear. Tudo isso é muito específico e não científico
para que as variáveis possam ser controladas.
Foi-se
o momento em que o que tinha de ser seria, foi-se o momento em que sabíamos para
onde iríamos. Não há escolha já que todas as moléculas tem um resto de
autonomia. O microscópio não amplia porque tudo está lá, na mais perfeita desorganização,
e cada combinação não passa de um mero acaso. Não importam grandes predições,
embora sejam belas. Cada movimento deixa um resquício inominado de
probabilidades que não se decantam e se transformam em algo que jamais ele poderia
supor. Esse pedaço de verdade constitui a sua mais perfeita identidade que se subsumi
ao que estaria posto de antemão e que se responsabilizaria pela guia da direção
que não se estipula.
Há
todo o sentido em cada lampejo da mais pura variação e, por isso, um corpo não se
nega. Uma razão só é válida na medida em que se descarta a carne que sangra. É daí
que brota a ansiedade que transforma até a besta em exímia enxadrista. Não
se pode aceitar a menor alegação de que haveria de se supor mal traçados planos.
Em nenhum momento falou-se qual era, em definitivo, o ponto que deveria ser
valorizado no caso de serem expostas as incongruências que só fazem concluir
que cada minúscula partícula é igual entre si e, por isso, concorrente na
corrida que é vital para algum tipo de encadeamento. Só nos resta sentir.
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