sexta-feira, 8 de abril de 2016

Notas sobre o paralelismo psicofísico*

Fechner
O paralelismo psicofísico não privilegia nenhum dos lados, nem o materialismo e nem o idealismo, pois trata a relação empírica entre ambos como uma relação funcional. Trata-se de duas atividades: de uma perspectiva interna a mente coincide consigo mesma; de uma perspectiva externa a mente é a base material [1]. Assim, não se observa mente e corpo simultaneamente, não se pode estar fora e dentro.
Corpo e mente são paralelos. Se para Leibniz havia dois relógios [sincronizados], aqui se simplifica para um, dispensando o interacionismo entre eles [ou o ocasionalismo ou a harmonia preestabelecida] (não importa, é funcional) [2].
As ciências naturais baseiam-se na perspectiva externa e as humanidades na interna; a filosofia natural vê a unidade, o duplo de corpo e mente, a partir de relação empírica, não metafísica.

Heidelberger
O paralelismo psicofísico é, por alguns, confundido com a doutrina cartesiana das duas substâncias que interagem, mas na realidade é o oposto porque ele nega a divisão do mundo. Trata-se de um dualismo de aspectos.
Em sua forma primária, o paralelismo psicofísico é um postulado empírico: para cada evento mental há um evento físico que lhe corresponde, regularmente, de acordo com uma lei. Ou seja, eles são funcionalmente dependentes e há, aí, um método de investigação. A dependência funcional entre eles nada diz a respeito da relação causal ou interativa entre corpo e mente, o método é neutro a qualquer consideração metafísica. Livrando-se de tais explicações descreve-se claramente a dependência entre os fenômenos, aproximando-se de uma superveniência [3].
Há uma segunda forma de paralelismo psicofísico que se vale de uma teoria metafísica para explicar a correlação, tratando o ser humano como uma entidade única com dois aspectos diferentes: mental e físico. Chamada de visão de identidade ou doutrina das duas perspectivas versa que: da perspectiva da própria identidade suas propriedades são consideradas sob um aspecto mental; de uma perspectiva externa a entidade é considerada um algo físico. Há esse viés metafísico que é acausal, não interacionista e que se vale de uma perspectiva em que algo é dado. Fechner considera metafísico qualquer adendo ao postulado empírico porque nenhuma experiência pode prová-los.
Seja o postulado empírico ou a teoria da identidade, esses vieses do paralelismo psicofísico abrem um bom caminho ao materialismo independente de uma doutrina metafísica universal. Também garantem a área de atuação da psicologia no mental desvinculada do físico e uma autonomia da filosofia além da neutralidade científica.
Podemos perceber a influência de Fechner em Mach que abraçou o postulado empírico livre de adendos, se apoiando em dependências funcionais neutras entre os fenômenos e sem nenhuma relação causal ou explicação, visão cética e antimetafísica, que legou o empirismo lógico.
A força da teoria da identidade vem da dificuldade de reconhecer o pensante independente do material; de uma aparentemente causalidade entre cada domínio separadamente, o físico e o mental; da conservação de energia física (sem um processo mental aí consumindo); de sua simplicidade e frugalidade.
E a sua terceira forma, uma tese cosmológica que, por analogia, expandiria a presença de processos psíquicos para além do humano, aproximando-se de um pan-psiquismo. Forma esta que levou ao rechaço até mesmo da segunda forma de Fechner, que deveria estar mais associada a um paralelismo psicofisiológico (livre do místico).
______
* Tirado dos trechos selecionados de Fechner e Heidelberger pelo prof. Osvaldo Pessoa Jr., para a disciplina de Filosofia das Ciências Neurais. In: http://www.fflch.usp.br/df/opessoa/Fechner-Paralelismo-1.pdf.
[1] Em 07/04, segundo Pessoa: interno é mente e externo é cérebro.
[2] Em 07/04, segundo Pessoa: interacionismo é o de Descartes: há relação de causa entre corpo e mente; harmonia preestabelecida é de Leibniz: Deus criou o melhor dos mundos possíveis com as séries sincronizadas e correndo em paralelo; ocasionalismo de Malebranche: Deus tá sempre ajustando os ponteiros para que o mental esteja de acordo com o material. E Espinosa: há só uma substância com dois aspectos. E Huygens: um relógio transfere impulso ao outro e vice-versa e eles se sincronizam – é físico.
[3] Em 07/04, segundo meu entendimento da aula: superveniência como uma sobreposição do material no mental.

Nenhum comentário:

Postar um comentário