Descartes enfatizou o problema do
conhecimento que vem dos sentidos que nos enganam, quer uma vez ou sempre. Ele
suspendeu o mundo e se fechou no penso. Remetendo à Platão e seu
mundo das ideias mais reais que o mundo real, ideias antes do mundo, ideias
antes da existência. Platão buscava um ideal de conhecimento verdadeiro que vinha da ideia universal, do imutável que é em si e está nas coisas. Descartes flertava com o conhecimento certo e seguro que é estabelecido a partir de regras racionais de dedução, conhecimento demonstrativo e operado pelo juízo.
Conhecimento de objetos matemáticos ideais descolados porque, para ele, se a causa do erro era o sentido, ainda assim precisaríamos fazer ciência.
Grandes impropérios para Hume que apostou que toda ideia vinha da experiência, do sensível. Assim, o conhecimento possível é o da
impressão que é mais viva e dela viria a ideia. Se não referenciasse o dado não haveria garantias. Descartes: cético dos sentidos, Hume: cético da
racionalidade, a segurança cartesiana se despedaça na nossa imperfeição, na
nossa limitação natural. Mover-se no mundo é guiar se por crenças que se
comprovam na experiência, é se valer de hábitos adquiridos, comprovados, ousados, abusados e relacionados pela imaginação. A nossa natureza age assim
relacionando e conhecendo o que há. Limitada e imperfeita, é a imperfeição que
abre espaços para as conexões, o certo e seguro cartesiano, que é abstrato, não tem lugar aqui.
Isso posto à guisa de introdução, fica a questão de saber qual telos se esconde por trás de tais filosofias. Descartes queria um conhecimento científico e inabalável em um momento
de autoridade da igreja e fez malabarismos. Não é tarefa fácil rasgar a
tradição vigiado pela tradição. E achou um ponto arquimediano, enfim. Hume
repousou em berço esplêndido de nova, mas consistente tradição racionalista, mas inovou. Ante a prova cartesiana, a possibilidade humiana. Hume verificou uma característica da nossa natureza que não acessa os segredos e causas primeiras e propôs uma filosofia experimental que lhe fosse adequada, a superação de uma metafísica de ciência dogmática em prol do possível. É porque Descartes fica no dentro, na escrivaninha, que ele consome e produz
ideias. Hume vai para fora, para um fora de impressões e descobertas.
De nossa parte, em meu tempo, junto
os dois, mas separando-os, Descartes de dia e Hume de noite. Se Descartes foi ciência aqui é trabalho. Divido os dois não pela episteme, mas pela linguagem que
hoje me intriga. Assim penso em usar duas linguagens, uma certa e segura e
outra imperfeita. Uma pensada, útil, necessária, vital. Vital porque o sistema nos onera e exige essa linguagem. Não há
espaço para divagações e ruído. O
público hoje virou trabalho, o público não é participação política, o público é
obrigação, compromisso, quase escravidão. De noite, fora do local de trabalho, na rua, em casa, a
linguagem é outra, é a que viaja, relaciona. Isso talvez pareça Habermas e sua razão comunicativa. Mas também parece conciliação e já é um progresso do
pensamento sair da racionalidade em algum momento.
(*) esboço a ser aprofundado.
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