sábado, 22 de junho de 2024

Um problema de linguagem

Uma primeira reflexão sobre a linguagem privada

Eu falo e você me ouve, mas entende? Ora, aparente sim, nos comunicamos e a vida segue. A gente vai conversando e se comunicando, a gente vai sobrevivendo. O problema é que não há garantias de que você entende o que eu falo e um dos pontos principais é a suposição de que há uma linguagem privada que você tem e outra que eu tenho.

É como se você precisasse inferir a partir do seu estoque de coisas mentais, de coisas aprendidas, o que eu digo. Esse tipo de pensamento traz a impressão de que cada um tem a sua caixinha de coisas guardadas que dão sentido ao mundo. Então eu digo algo do meu estoque que tem um significado para mim e você escuta e processa de acordo com o seu mundinho. Vida que segue.

Ocorre que essa linguagem privada é quimera. Você pode ter uma dor dente e essa dor de dente é sua. Não adianta você me dizer que dói demais, eu não sei o que é isso. Eu posso saber por uma expressão, por uma cara de dor ou por uma reclamação reiterada. Você não pode me comunicar a sua quantidade de dor de dente e não há uma regra para medir a sua dor dente. Ora, com a linguagem é o mesmo.

Não adianta você dizer que entende A ou B do que eu falo. E eu falo C. A, B e C são coisas mentais e privadas e não existe uma linguagem privada porque não existe linguagem de uma pessoa. Pode haver um discurso mental, aquele capetinha que fica no ouvido. Mas isso é seu, não me importa.

Pode haver, no mínimo, uma linguagem de dois, mesmo que seja um dialeto, mas é algo que vai se acordando. Linguagem é acordo, é para fora, não é para dentro. Não importa o que algo significa para você, importa o que você expressa e o que o outro pode entender, e isso é um problema básico de linguagem.

  

3 comentários:

  1. Trata de um problema de linguagem que me surgiu quando dando uma lida em “ESTUDO SOBRE REGRAS E LINGUAGEM PRIVADA”. Acesso em 22/06/2024 pelo link: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8133/tde-02122009-093554/publico/NARA_MIRANDA_DE_FIGUEIREDO.pdf.

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  2. Há um equívoco em tratar a dor de dente como incomunicável, esse é outro problema de linguagem que estamos tentando entender e tratamos duas reflexões adiante

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  3. O problema está na frase "eu tenho uma dor de dente que não posso comunicar". O correto seria "estou com aquela dorzinha de dente, sabe?"

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