sábado, 19 de outubro de 2024

Comprimindo sistemas complexos

Traz aspectos da classificação de Dennett para termos intencionais[i]

Retomando a conceituação de Dennett para uma mente, cabe passar pela tese da inescrutabilidade da referência.

Há um dado que é a dificuldade de explicar uma mente, dada a sua complexidade. Já abordamos que, para Dennett, a mente é uma construção teórica que utilizamos para a descrição do que ocorre no cérebro. Nesse sentido, utilizamos o vocabulário da psicologia popular que atribui um sistema internacional a organismos dito inteligentes. Porém, não há, no cérebro, intenções, crenças e desejos, há somente neurônios, sinapses, tempestades elétricas e coisas semelhantes.

Ora, para crenças, intenções e desejos há a inescrutabilidade da referência, isto é, não conseguimos investigar a referência de tais estados mentais porque há indeterminação da tradução de estados mentais em estado celebrais. Dennett empresta a tese quineana da tradução radical que postula que, ao utilizarmos a tradução de termos de outras línguas para nossa pela observação do comportamento, podemos ter como resultado vários manuais, pela falta de definição de critérios.

 Lembremos de gavagai: é um coelho, é comida ou é a orelha do coelho? A tradução usada pela observação, e não pelo significado, torna a referência inescrutável. Entretanto, isso não abala neurociência que tenta decifrar o código cerebral / neuronal. Ela ganha força com avanços da biocomputação, com a capacidade de implantação de nano chips no cérebro e técnicas de neuroimagem.

Ocorre que, por mais que haja sucesso em alguns experimentos, Dennett jocosamente chamará esses cientistas de neurocriptógrafos que buscam construir um cerebroscópio capaz de escanear nosso cérebro. Assim, para descobrir se um suspeito é o criminoso, bastaria olhar seu cérebro[ii].

 Por fim, Teixeira apresenta a visão de Dennett para a folk psychology. Em um primeiro momento destituindo-a de ontologia e sem papel causal sobre o corpo, depois tratando-a instrumentalmente, como mera ilusão, o que o levou a ser considerado um relativista. De fato, há dificuldade em se encontrar um lugar para os termos intencionais dentro do cenário materialista. Mas a posição final de Dennett será o meio termo entre instrumentalismo e realismo: os termos intencionais serão classificados de “abstracta”, como por exemplo, um “batalhão de soldados” ou “corpo diplomático”. É um realismo moderado. É como o centro de gravidade: artefato teórico que existe, mas não é um objeto físico. Da mesma forma que crenças é desejos.

Além disso e primordialmente, “abstracta” nos permite identificar padrões de comportamento, encontrar regularidades comportamentais por meios de algoritmos de compressão. Dada a enormidade de padrões de comportamentos, podemos comprimi-los por meio de intenções, crenças e desejos, podemos condensar sistemas complexos. São os abstracta que nos capacitam a fazer previsões e sobreviver já que, no geral, não se vê aleatoriedade absoluta na natureza.



[i] Finalizando o primeiro capítulo de A mente segundo Dennett, de, João de Fernandes Teixeira. São Paulo: Editora Perspectiva, 2008.

[ii] Mas não entraremos aqui nos detalhes da replicação de DNA, uma suposta versão biológica da máquina de Turing, e nem na argumentação de Siegfried contra a leitura cerebral. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário