segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Prevendo previsões

Procura mostrar que uma teoria da mente se baseia na capacidade de prever não somente nossas previsões, mas as dos outros seres inteligentes[i]

Aprofundando um pouco mais a visão que Dennett tem da mente, Teixeira o conceitua como uma antiplatonista, no sentido de que não acredita na existência das ideias e entende a mente como uma interpretação do que ocorre em nosso cérebro, se manifestando pelo comportamento. Essa visão é fortemente influenciada pelo campo de estudo da inteligência artificial, oriunda de Turing e acenando para a possibilidade do processamento inteligente em máquinas.

Destaquemos dois pontos que Teixeira nos traz: primeiro que o teste de Turing para atribuir estados mentais a máquinas se vale da indiscernibilidade do comportamento linguístico e, depois, que é um critério operacional, ou seja, não se debruça na natureza desses estados, mas no seu funcionamento, seja de um organismo ou dispositivo[ii]. Se tal enfoque é prato cheio para os behavioristas, Dennett não segue exatamente essa linha, mas captura os estados mentais como termos teóricos que permitem falar do comportamento. Citando Teixeira, à página 33:

“Desta perspectiva, estados mentais como ‘intenções’, ‘crença’ e ‘desejos’ e todo o vocabulário mentalista habitual que forma a psicologia popular (folk psychology) podem permanecer em um limbo ontológico, ou seja, não precisamos atribuir-lhes realidade própria ou independente dos olhos de quem observa o comportamento”.

Assim, a mente passa a ser somente uma construção teórica útil e distante de uma visão de realidade mental que é, a princípio, aceita por todos nós. Ora, o aparato conceitual que a psicologia usa para tratar da mente é transformado por Dennett em um sistema intencional usado para descrever algo dotado de uma mente. Ocorre que, para atribuir um sistema intencional a algo, é preciso observar o seu comportamento para ver se é inteligente. Então, interagimos com esse algo e tentamos predizer suas ações, se aparentam serem racionais ou se se adaptam a novas situações, se são flexíveis.

Entretanto, dada nossa ignorância em não podermos afirmar se há um correlato no cérebro, nos utilizamos do sistema intencional. Por mais complexo que seja um dispositivo ou organismo, mais difícil explicar seu comportamento sem renunciar a intenções e desejos, qual seja, uma vida mental nos termos da psicologia popular. Psicologia essa que se vale dessa estratégia preditiva tão preponderante em nossos, humanos, que somos capazes crer, conhecer e assim por diante., a nós mesmos e aos outros.

Há, fundamentalmente, um desenvolvimento de um modelo mental do outro, como em um jogo de xadrez, em que se tenta sempre prever e a previsão do outro. Nossa inteligência funciona antecipando experiências que ocorrerão e de que forma agiremos, conforme ressalta Teixeira, recobrindo uma inteligência maquiavélica que origina a psicologia popular que nos permite sobreviver.

Teixeira também destaca que é necessário que ao menos outra mente para a postulação de um sistema intencional, assim como a linguagem requer dois falantes. Ele traz a teoria de neurônios espelhos que seriam ativados quando atribuímos estados mentais a outrem e, daí, o correlato neural para a teoria da mente[iii].

Por fim para esse momento, Teixeira caracteriza o campo de estudo da inteligência maquiavélica e psicologia popular como habilitar da disciplina de inteligência artificial social, ciência deveras complexa para dar conta de robôs que interagem com humanos. Seus estudiosos esperam que, um dia, robôs participem da vida social e sociologia permitirá que simulações sejam feitas para verificar o comportamento desses agentes.



[i] Iniciando capítulo I de A mente segundo Dennett, de, João de Fernandes Teixeira. São Paulo: Editora Perspectiva, 2008.

[ii] Teixeira levanta desafios ao teste de Turing como, por exemplo, uma limitação temporal, já que programas de computador tem que ser finitos e decidíveis.

[iii] Tema que deve ser explorado oportunamente.

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