segunda-feira, 19 de junho de 2023

O esse do concreto ao universal

Entre o objeto, a ostensão, o Sinn e o uso

É interessante notar a proximidade do indexical com o mundo. Sua primazia pode ser ressaltada com o demonstrativo “esse” que, acompanhado do gesto de ostensão, toca a realidade. Quando dizemos “essa pessoa” apontando para ela, não resta dúvidas: ela está lá. E isso comunica muito mais do que dizer “a pessoa que está lá” ou a pessoa X (descrição definida e nome próprio, respectivamente)[i].

Contudo, essa pretensão de certeza trava a linguagem porque fixa o sentido. Por um lado, “essa pessoa” é “essa pessoa”, pessoa concreta, embora essa coisa “essa pessoa” possa trazer significados diversos. Por outro lado, “essa pessoa” é uma formulação universal porque eu só poderia falar daquela pessoa usando o “essa” (demonstrativo) “pessoa” (objeto). Quando a linguagem toca a realidade ela vira uma passagem, não deixa “pegar um sentido”. Só que há vários, várias sintaxes.

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Eu concluí um fluxo similar ao seguinte, das primeiras palavras de CC no Cognitivismo[ii]: “objeto” [uma pessoa] <= “indexical” [essa pessoa] (está pertinho) <= “descrição definida” [a moradora do apto 23] (comunica algo) <= “nome próprio” [Maria] (indistinto).

Já Wittgenstein, sobre demonstrativos: “O demonstrativo “este” nunca pode ficar sem portador. Poderíamos dizer: “Enquanto houver um este, a palavra ‘este’ tem significado, seja este simples ou composto”. – Isso, contudo, claramente não faz dessa palavra um nome. Ao contrário; pois um nome não é utilizado com um gesto ostensivo, mas apenas explicado por ele.”[iii]

E sobre nomes e descrições: “Nomear e descrever não estão, de fato, em um mesmo plano: O nomear é uma preparação para a descrição. O nomear ainda não é, de modo algum, um lance no jogo da linguagem, - assim como colocar uma peça de xadrez sobre o tabuleiro ainda não é um lance no xadrez. Pode-se dizer: Com a nomeação de uma coisa ainda não foi feito nada. Aliás, ela não tem um nome, a não ser no jogo. Eis também o que Frege queria dizer ao afirmar que uma palavra tem significado apenas no contexto da frase”[iv]

O mais interessante é que, pelas Investigações, minha pergunta de praxe: “Eu falo e você me escuta, mas entende?” teria uma resposta em aberto, variando entre sim e não, a depender do contexto e demais envoltórios.



[i] Se existir algo lá.

[ii] COSTA, C. Cognitivismo Semântico: Filosofia Da Linguagem Sob Nova Chave. Curitiba: Editora Appris, 2022.

[iii] Investigações Filosóficas. Ludwig Wittgenstein. São Paulo: Fósforo, 2022. Sessão 45, p. 54.

[iv] Idem. Sessão 49, p. 58. 

Um comentário:

  1. É nesse último sentido que podemos entender o solipsismo quando falamos e não somos entendidos, por isso o esforço na comunicação

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