sábado, 8 de abril de 2017

Incômodo*

O que te incomoda? O que me incomoda? É um problema pessoal, familiar, social? É físico? Ou metafísico? Há algo que te incomoda? Há algo que me incomoda. Precisamos de um problema, o grande problema. Há tantos problemas... Mas qual é “o” problema? Há algo mal resolvido, sempre. Não fazemos nada tão interessante, escutamos e vemos tantas coisas. Cremos nisso? No que cremos? Nosso problema é a crença? É a vida ou a morte? É Deus ou o Diabo? Se existe, ponhamos com maiúscula... Ou o incômodo é simplesmente e nada mais do que o trânsito ou nosso time de futebol que não ganha? A fofoca é um problema? Seria a miséria ou a má distribuição de renda que gera tanta desigualdade e violência? E aquelas festas familiares tediosas e com sorriso amarelo em todos os rostos? Haveria de ser as manifestações com todo mundo de amarelo? Ou de vermelho, sei lá.
O incômodo que buscamos (e só há vida se há incomodo, e só há vida se há incômodo que queremos superar) deveria ser aquele incômodo que “realmente” nos incomoda. Ou seja, um incômodo concreto. A nosso busca pelo incômodo, aqui, agora (nesse momento), visa o não incômodo, ou seja, a sua superação. Eleger o incômodo significa que, dentre tantos, buscamos algo extremamente importante e que deve ser resolvido. Haverá uma resposta para o incômodo e queremos achá-la. Portanto, a eleição do incômodo é o critério valioso. Não deve ser qualquer um, deve ser algo que nos marca e nos acompanha, lá, no subterrâneo. Algo latente, mas não manifesto, talvez mais imanente do que transcendente. O transcendente aceita muitas respostas e gera controvérsias, mas podemos concretizar o transcendente.
Pode ser que um dos maiores obstáculos na superação de um incômodo e, por isso, em sua eleição, seja nossa passividade. Todas as respostas já foram dadas. Basta procurar, não é preciso formular. Afinal, faz tempo que estamos aqui habitando esse planeta e não haveriam tantos problemas novos. E esse, definitivamente, é o ponto. Saber que há problemas, saber que há respostas e: saber que não é a nossa resposta!!! Aceitar as respostas, adaptar as respostas à nossa situação e mudarmos. Não o incômodo, mas a sua formulação. Mudamos a formulação do incômodo para achar uma resposta escondendo o verdadeiro incômodo e o colocando na vala de todos os incômodos indiscerníveis e seguir.
Estaríamos fadados a esse fim? Mudar a formulação dos nossos incômodos para que as respostas já dadas os resolvam? Parece que sim porque é assim que ocorre, é dessa maneira que sempre vimos as coisas. A ciência, entidade que comanda nosso progresso, a promessa, age assim: universaliza-se, acha-se uma lei, generaliza-se excluindo o particular. A lei da gravidade é a lei geral que vale para todos os corpos, até para os celestes!! Mas, além de tal utilidade e, claro, conforto, já que a lei da gravidade é um passo na longa escalada tecnológica que nos trouxe a esse grandioso tempo super-informatizado e digitalmente inteligente, essa fórmula responde ao meu incômodo ou será que eu que transmuto o meu incômodo aos incômodos dados e respondidos?
Está na hora de mudar o método. Partir do incômodo único e pessoal, singular. É o seu, o meu incômodo que precisa de resposta. É a sua, a minha investigação que vai proporcioná-la. Obviamente, interessa a resposta para incômodos similares e podemos usá-la, mas não como fórmulas prontas porque o incômodo é biográfico, está inscrito em nós. Está na hora de levantar da poltrona e ir para o palco. Mentes brilhantes deram respostas brilhantes e iluminaram a sociedade, mas quantas mentes brilhantes foram ofuscadas? Buscar o incômodo é a chave para buscar a resposta e sistematizar. Haja quantos sistemas houver, haja quantos incômodos forem necessários, todas as respostas devem ser publicadas e um dia podem ser lidas, pois estarão catalogadas na biblioteca de Babel.

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* Maurício Ramos e o método que busca o conceito genético. Formas em movimento: ontogênese e sobrevivência, 07 de abril de 2017.

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