segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Base física do efeito estufa e aquecimento global

Sobre as bases físicas que mostram que as emissões antropogênicas de gases estufa contribuem para o aquecimento global[i]

Introdução. Com a emergência da temática ambiental, nos interessa entender questões ligadas às mudanças climáticas e ao aquecimento global. Para isso, requer voltarmos a conceitos básicos outrora vistos para melhor compreensão desses fenômenos, ou seja, suas bases físicas. A respeito do artigo, mais precisamente, os autores enfocam o aquecimento global cuja causa dominante é a ação humana, de acordo com a evolução das pesquisas científicas no último século e a despeito de alegações em contrário[ii]. Então, o efeito estufa tem papel preponderante na regulação da temperatura planetária.

O papel da composição atmosférica na temperatura planetária. Os autores trazem o raciocínio de Fourier, primeiro a tratar da temperatura planetária, de que a Terra, recebendo energia constantemente do sol, deveria reemiti-la de volta pois, de outra forma, superaqueceria e assim poderia manter uma temperatura de equilíbrio. A energia solar atinge os planetas de seu sistema por ondas eletromagnéticas cujas intensidades dependem da luminosidade do astro e da sua distância. Porém, boa parte dessa energia não é absorvida pelo planeta[iii], já que uma parte é refletida pela atmosfera e outra parte pela superfície. Ocorre que o planeta recebe a luz solar em metade de sua superfície e a reflete por toda a sua extensão (conceito conhecido por albedo[iv]). A figura abaixo ilustra esse ponto.

Os itens elencados acima fazem com que a temperatura de equilíbrio da Terra (-18º) seja bem menor do que a temperatura em sua superfície, em torno de 15º. Comparando com outros planetas que têm as temperaturas estimadas, podemos notar a diferença entre elas, conforme a tabela que segue.

Se Mercúrio e Marte as têm próximas, isso não ocorre com Terra e Vênus que as têm distintas exatamente por conta da atmosfera de cada um. Se a atmosfera é substancial, isto é, espessa e com gases estufa, ela absorve parte da radiação refletida e aumenta a temperatura da atmosfera baixa, qual seja, da superfície e a isso dá-se o nome de “efeito estufa”. Já a próxima tabela ilustra as tênues pressões atmosféricas em Mercúrio e Marte que não geram as diferenças de temperatura bem como o oposto para Terra e Vênus.

Vênus que, mais longe do sol do que Mercúrio, ainda assim apresenta alta temperatura devido à junção da alta pressão com alta presença do gás de efeito estufa dióxido de carbono, como podemos ver a seguir.

Ainda conforme a tabela, embora Marte também tenha alta presença de CO2, ele é pouco concentrado como se pode ver pela sua pressão atmosférica, que faz com que o planeta não absorva muita radiação infravermelha oriunda da superfície. A tabela também mostra a distinta composição de gases que a Terra apresenta com relação aos vizinhos Vênus e Marte (conforme figura dos planetas do sistema solar que se segue[v]) e, embora seja baixa a concentração de dióxido de carbono, ele se junta a outros gases (vapor d’água, metano e óxido nitroso) para compor o efeito estufa e aumentar a temperatura da superfície em 30º acima da temperatura de equilíbrio.

Os autores também enfatizam que é a própria vida na Terra, sua biosfera, que regula a composição química da atmosfera pelos ciclos biogeoquímicos e, se a vida fosse extinta, rapidamente teríamos uma composição similar a Vênus e Marte.

Detalhamento do efeito estufa da Terra. Embora Fourier tenha afirmado que o calor encontra menos resistência ao entrar na atmosfera em estado de luz do que ao sair como calor não luminoso, a base física só foi evidenciada com o uso de um espectrofotômetro por Tyndall, em 1859, que mostrou que dióxido de carbono e vapor d’água (CO2, H2O) poderiam absorver radiação infravermelha, enquanto oxigênio, nitrogênio e hidrogênio não (O2, N2, H2).

Contudo, só no século XX se clarificaram as medidas e os gases de efeito estufa, nomeadamente: CO2, H2O, CH4 (metano), N2O (óxido nitroso), CFCs e O3(ozônio) que absorvem radiação infravermelha. Abaixo são mostrados os comprimentos de onda com destaque para o espectro visível e também as ondas longas de infravermelho na qual os gases estufa são ativos radioativamente.

Então, conforme já dito, o sol emite ondas eletromagnéticas para nós numa radiação visível que não é absorvida por esses gases (0,4 μm a 0,7 μm). Cerca de 70% dessa radiação visível entra na Terra aquecendo-a, que então emite radiação infravermelha para o espaço que é obstruída pelos gases estufa, esquentando a baixa atmosfera.

Acima o desenho esquemático do efeito estufa, com destaque para a emissão de dióxido de carbono em todas as direções. Outro ponto é que, quanto maior a temperatura de um corpo, menor o seu comprimento de onda emitida e aí a Terra, bem menos quente que o sol, emitindo na faixa do infravermelho em torno de 10 μm (isso será mostrado em outro gráfico mais a frente). Pois que, pelo estudo da espectroscopia do infravermelho para o dióxido de carbono, é mostrado que ele absorve radiação nos comprimentos de onda de e 4,2 μm e 15 μm, ou seja, ele é opaco nesses pontos (e vai coincidir com o comprimento de onda da Terra, como se verá).

Os autores ainda trazem uma questão extremamente técnica para esclarecer as bandas de absorção do CO2 e sua interação com a radiação infravermelha. Sucede-se que a radiação infravermelha incidente na molécula de CO2 possui frequência compatível com a frequência de vibração do mesmo e este absorve radiação em uma mudança do momento de dipolo, que ocorre quando a molécula vibra e interage com os campos elétricos e magnéticos da radiação.

Acima é mostrado os modos normais de vibração do CO2 com destaque para os momentos de absorção v2 e v3, ao passo que o estado v1 é apolar (simétrico). Trazendo o gráfico da emissão da radiação da Terra abaixo, vê-se a atuação da banda de 15 μm (v2 acima) atuando na faixa de 10 μm, indicando a existência do efeito estufa.

O balanço energia da Terra: o efeito estufa em ação. A despeito do comportamento do CO2, etc., os autores ressaltam que o mecanismo principal da temperatura planetária é o balanço de energia da Terra, qual seja, a manutenção da temperatura média entre as intensidades de energia entrantes e saintes. De acordo com os cientistas, um desequilíbrio que possa levar a mudança da temperatura média ocorreria por três possiblidades ou forçantes climáticas: 1.) mudança da radiação solar entrante, seja por mudança na intensidade da radiação solar ou da órbita da Terra (que não tem acontecido, segundo observações), 2.) mudança do albedo da Terra, pela mudança de cobertura das nuvens, partículas de aerossóis e cobertura do solo (também não ocorre) e 3.) mudança da radiação terrestre para o espaço, devido à alteração na concentração dos gases de efeito estufa.

Não obstante, convém lembrar que a temperatura de equilíbrio se dá a uma altitude média da atmosfera acima dos gases estufa e, abaixo deles, há a temperatura da superfície que recebe a reemissão da radiação para baixo e aí se aplicam modelos de medida da transferência radioativa que não nos interessa detalhar agora, embora os autores os tivessem simplificado em  um modelo de linha que abstrai as camadas da atmosfera e outros fatores como correntes oceânicas, variações dos espectros de onda, transferência de energia entre as camadas e distribuição dos gases.

De todo modo, desse modelo é possível estimar a temperatura da superfície a partir da temperatura de equilíbrio, chegando a um valor de ~303 K (-273 = 30º, acima dos 15º por conta da simplificação) e permitindo mostrar que a “radiação reemitida para baixo contribui para o aquecimento da superfície” (p. 16) e também que, em última instância, a radiação escapa a altas altitudes e o aumento dos gases de estufa irá aumentar a temperatura de superfície e sua diferença com relação à temperatura de equilíbrio, desequilibrando o balanço.

O aumento do efeito estufa e a busca do balanço trazem aquecimento. Se o efeito estufa é um processo natural e essencial para a vida na Terra, a mudança da composição química da atmosfera pela concentração de gases de efeito estufa, sem dúvida, irá aumentar a temperatura do planeta. Acontece que, se é mantida a radiação entrante e os gases de efeito estufa dificultam a sua saída, há um desequilíbrio entre a entrada e a saída de radiação. Nesse caso, a Terra precisa esquentar para reequilibrar o fluxo de energia e, aí, atinge um novo estado de equilíbrio.

A figura acima ilustra a busca pelo balanço de energia quando, em b), o aumento da concentração de dióxido de carbono irá diminuir a temperatura de saída para 236K e, então, a Terra se aquece (3º) para atingir o novo equilíbrio. Esse valor de incremento e sua rapidez de aumento ainda são debate entre os cientistas, conforme enfatizam os autores.

Papel do CO2 no aquecimento global. Se o vapor d’água contribui mais do que o CO2 entre os gases com efeito estufa (vapor d’água = 50%, nuvens = 25%, CO2 = 20% e demais gases 5%), o CO2, além de não condensável, apresenta evidências de relação com as eras do gelo[vi] e é parte da história climática da terra. Soma-se a isso que o nível atual de CO2 jamais foi atingido no período observado (um pico de 300 contra 400 ppm atuais das emissões humanas pós revolução industrial)[vii].

Já o vapor d’água é condensável e se regula pela temperatura da atmosfera que vai comportar determinada quantidade, o resto condensa-se. Assim sendo, ele não é considerado uma forçante climática e se associa com o mecanismo de retroalimentação. Conclui-se que o CO2 é o termostato da terra, já que a sua ausência atmosférica levaria a um congelamento do planeta.

A contribuição de dióxido de carbono de origem humana é demonstrada pelas conhecidas anotações de Charles David Keelling, ilustradas abaixo.

Se aliarmos esse dado com as medições de temperatura ao longo dos anos (considerando incremento de 1º desde a revolução industrial) e com as comprovações cientificas que descartam as outras forçantes climáticas, os autores afirmam que:

“O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) criado em 1988 sob o comando da Organização Meteorológica Mundial (WMO) em seus relatórios tem atestado com níveis de confiança cada vez maiores que as evidências científicas são suficientemente fortes para afirmar que o aquecimento observado tem como causa dominante as emissões antropogênicas de gases estufa (Ipcc, 2013)”

Por fim, os autores sintetizam o argumento da seguinte forma:

1. O efeito estufa é um fenômeno natural essencial à vida na Terra.

2. O mecanismo do efeito estufa opera a partir das moléculas dos gases estufa que absorvem a radiação infravermelha emitida pela Terra, reemitindo uma parte de volta para a superfície terrestre.

3. As emissões humanas estão aumentando a concentração de gases estufa na atmosfera.

4. Um aumento da concentração de gases estufa na atmosfera intensifica o efeito estufa da Terra.

5. Um efeito estufa mais forte causa um desequilíbrio no balanço de energia da Terra.

6. Para retornar ao equilíbrio energético a Terra precisa esquentar tendo como resultado o aquecimento global.



[i] Conforme https://if.ufmt.br/eenci/artigos/Artigo_ID531/v13_n5_a2018.pdf: Efeito Estufa e Aquecimento Global: Uma abordagem conceitual a partir da física para Educação Básica. Simplificado, resumido, sem fórmulas 😊.

[ii] “Fatos alternativos” citados: 1.) o planeta não está aquecendo, mas resfriando; 2.) estamos num ciclo natural; 3.) as emissões de dióxido de carbono não são um problema; 4.) o efeito estufa não existe.

[iii] Energia absorvida = potência.

[iv] Conforme http://sigep.cprm.gov.br/glossario/verbete/albedo.htm, albedo é a medida da quantidade de radiação solar refletida de um objeto ou alvo com relação a quantidade de energia incidente. O albedo varia de 1 (reflexão total de corpo refletor perfeito) a 0 (absorção total de um corpo negro), que são extremos teóricos inexistentes na natureza. O albedo da Terra como um todo, incluindo as nuvens, é em torno de 0,4, ou seja, 60% da energia solar incidente é retida no sistema Terra.

[vi] Conforme citação dos autores dos estudos feitos na estação Vostok da Antártica.

[vii] Não só o dióxido de carbono, como metano, óxido nitroso, ozônio e clorofluorcarbonetos apresentam aumentos expressivos de 1850 para cá, principalmente pela queima de combustíveis fosseis como petróleo e carvão, desmatamento, agricultura e pastagens.

Nenhum comentário:

Postar um comentário