Chalmers
defende que a experiência consciente é, ao mesmo tempo, o que melhor
conhecemos, mas a coisa mais misteriosa e, por isso, uma questão intrigante
para a ciência. Por trás da experiência objetiva de um sorriso ou de uma fala,
há um caráter subjetivo, interior. Mas, o behaviorismo e as ciências
cognitivas se limitaram ao comportamento externo do cérebro, mantendo o estudo
da mente inalcançável. Nos últimos anos, embora haja teorias que indicam que jamais conheceremos a consciência, a neurociência, a psicologia e a filosofia buscam
teorias que superem essa barreira, como, por exemplo, a teoria reducionista que
poderia fornecer uma descrição detalhada da consciência.
Para
Chalmers, haveria problemas fáceis e um problema difícil nos estudos da
consciência, embora mesmo os primeiros sejam complexos. A saber, o estudo dos
mecanismos objetivos referentes ao funcionamento do cérebro abordado pela
neurociência. Pelo lado difícil da questão, como explicar que tais processos físicos
provoquem estados mentais? Como brota uma consciência daí? O
experimento mental do quarto de Mary[1] ilustra bem essa distinção: a
neurocientista especializada em processos físicos e biológicos do cérebro
referentes à visão da cor, por somente ter visto o branco e o preto do seu
quarto, nunca vivenciou a experiência de sentir uma cor roxa. Compreendendo
tudo sobre os problemas fáceis e seus aspectos físicos, como explicar uma
experiência consciente acompanhando esses processos cerebrais? O experimento
mostra que o conhecimento detalhado dos processos cerebrais não fornece um
conhecimento completo da experiência consciente.
Do
que se segue que a neurociência não é suficiente para a explicação de tais
experiências, visto que ela avança a passos largos na resolução dos problemas
fáceis, mas se atentando às explicações sobre como o cérebro desempenha funções
cognitivas e comportamentais, sendo irrelevante o problema difícil de como tais
experiências são acompanhadas de estados conscientes. Chalmers
ressalta que, embora a neurociência ajude na compreensão do cérebro e mesmo de
sua relação com a consciência, ela nada acrescenta ao problema difícil e, para
ele, precisaríamos de um novo tipo de teoria. Isso porque, conforme determinou
o filósofo Henry Levine, há uma lacuna explicativa entre os processos físicos e
a consciência.
Se
houve uma crença de que a física seria uma teoria de tudo, que explicaria as
leis fundamentais do universo, o físico Steven Weinberg reconhece que a
consciência apresenta comportamento especial não redutível a leis físicas. Chalmers
propõe que seria necessário adicionar uma característica fundamental do mundo ao
catálogo da física, que seria a experiência consciente irredutível a algo mais
básico. A ela estariam submetidas leis psicofísicas que se relacionariam com as
leis físicas, formando uma verdadeira teoria de tudo que suplantaria a lacuna
explicativa. Tais leis psicofísicas seriam buscadas por argumentos filosóficos
e experimentos mentais a partir da experiência subjetiva individual e dos
relatos das experiências dos outros sujeitos. Seriam definidas leis de ponte
entre processos físicos e experiências cotidianas, o que de fato ocorre quando
estamos cientes[2] de algo que estamos fazendo, enfim, uma
informação consciente que usamos para nossos processos motores. Essa seria a
lei psicofísica fundamental: se há terciência, há consciência, e vice-versa. E
que pode ser refinada da seguinte forma: “a estrutura da experiência consciente
espelha-se na estrutura da informação na terciência e vice-versa”[3].
Tal
teoria, proposta por Chalmers, deveria se valer do conceito de informação como lei
psicofísica primária[4]. Ou seja,
haveria o mesmo estado informacional quer ser seja na consciência, quer seja no
cérebro. E mais, a informação poderia ter dois aspectos: um físico e um
vivencial e seria o resíduo que subjaz a ambos. Teoria esta que pode ser
melhorada ou refutada...
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CHALMERS, DAVID JOHN. O enigma da
consciência - 1995.
In: http://www.fflch.usp.br/df/opessoa/Chalmers-port-2.pdf - Reimpressão preparada por Osvaldo Pessoa Jr.
[1] Proposto pelo filósofo australiano Frank Jackson.
In: http://www.fflch.usp.br/df/opessoa/Chalmers-port-2.pdf - Reimpressão preparada por Osvaldo Pessoa Jr.
[1] Proposto pelo filósofo australiano Frank Jackson.
[2]
Estar ciente ou terciência, conforme Pessoa.
[3]
Chalmers faz um mapeamento entre processos físicos e experiência consciente
controverso, que poderia ser aplicado pelo experimento mental da troca de
neurônios de um cérebro por chips de silício mantendo a consciência. A
reprodução de um cérebro de neurônio em um cérebro de silício terá a mesma
consciência que nós? Chalmers argumenta que sim usando uma mudança de qualia
que necessariamente mudaria no estado comportamental.
[4]
Segundo Shannon, NIT, 1940: informação é um conjunto de estados separados que
mantem uma estrutura básica de similaridades e diferenças entre si.
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