sexta-feira, 19 de junho de 2015

A Filosofia como objeto

  Pobre Filosofia, colocada na balança dos homens, anjo caído. Não foi essa a filosofia que conheci. Eu conheci uma filosofia de libertação, de inversão. A filosofia que conheci invertia o real. Que bela!
  Me enamorei daquela filosofia porque ela não me cobrava nada. Conheci uma filosofia que me enfeitiçou e, tão enfeitiçado fiquei, que fui além, fui ver o que havia do outro lado. E qual não foi meu susto? Do outro lado havia gente, gente desamparada.
  Ah filosofia... Isto você não havia me dito! Ou eu que fui inocente? Você se entrega para poucos, mas me seduziu! Eu pensei que poderíamos ficar somente nós dois, vivendo um amor eterno. Imaginei que conseguiria me esconder do mundo, escondido atrás de ti.
  Mas, de tanto querê-la, dei mais um passo: passo fatal. Porque descobri que você me traia, me iludia. Ao não me deixar ver o mundo, você não me deixava que te mostrasse ao mundo. Mundo que poderia e vive sem você. Mas você vem desse mundo. Há uma boca que fala de você, há um fluxo que jorra você. Há uma mão de carne e osso que te escreve. E eu não queria ver tudo isso. Eu estava encoberto pelo véu de maia. Assim, fui indo, andando ao Deus dará, procurando... Doce filosofia, enfim, você me libertou. Porque você não é de ninguém, você é só de você mesma, você se acaba em si mesma. Você é redonda, não sabemos nem por onde começar a te conhecer, quanto mais se  um dia terminaremos.
  Quando o encanto se quebrou descobri um mundo ansioso, carente, potencialmente infinito. E triste, doloroso, injusto. A composição material, nossa e desse mundo, é muito falha. Cada corpo se perde num em si e clama um para si. Cada corpo é um polo objetivo incapaz. Ele atrai, mas não quer ser traído.
  Caminhando nas ruas esbarramos em corpos, trombamos com corpos, chutamos corpos. A rua é uma coleção de corpos mutilados, corpos que flanam ao sabor do vento. Aquele ventinho batendo na folha seca que resiste. A rua é um amontoado de tristeza incerta. Quanto sofrimento pelas ruas! Quanta desilusão. Não filosofia, você não é Deus, você não é santa, você vem dos homens. Mas você é o outro lado da locomotiva, é o lado de fora, é o verde das matas e dos morros, é o azul do céu, é o amarelo do sol. É o branco do meu olho cego. Aonde essa porta vai me levar? Posso abrir? Devo abrir?

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